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Feira orgânica do Rio da Prata - RJ: um estudo sobre mercados territorializados

Rio da Prata - RJ organic market: a study of territorialized markets

Fernanda da Silva Ferreira, Ketyline Pimenta Genaro

Resumo

O estudo dos mercados agroalimentares tem ganhado destaque nas Ciências Sociais, uma vez que esses estão inseridos em uma realidade social e permitem a compreensão das características de determinados grupos, além de influenciar a vida das pessoas. Este trabalho analisa a Feira Orgânica do Rio da Prata, na Zona Oeste do Rio de Janeiro, explorando a inserção de pequenos produtores da região em mercados orgânicos e agroecológicos. O objetivo é entender a feira como uma estratégia de resistência da agricultura familiar, enfatizando sua importância na integração desses produtores no mercado agroecológico. O estudo reconstitui o processo de criação da feira, destacando como ela projeta uma representação do território agrícola, promovendo discussões políticas e sociais sobre o espaço. A feira pode ser vista como um mercado territorializado, pois estimula o debate político sobre o território. Os resultados reunidos são parte de reflexões de trabalhos anteriores das autoras, onde compreende-se que o acesso ao mercado se traduz como uma forma de luta pelo território, de fazer conhecer e reconhecer (Bourdieu, 2006) a agricultura familiar no espaço da cidade.

Palavras-chave: Feira Orgânica do Rio da Prata, Mercados territorializados, Agricultura.

Abstract

The study of agri-food markets has gained prominence in the Social Sciences, as these markets are embedded in social realities and allow for the understanding of specific group characteristics, while also influencing people’s lives. This paper analyzes the Rio da Prata Organic Market, located in the West Zone of Rio de Janeiro, exploring the participation of small local producers in organic and agroecological markets. The aim is to understand the market as a strategy of resistance for family farming, emphasizing its role in integrating these producers into the agroecological market. The study reconstructs the creation process of the market, highlighting how it represents the agricultural territory and promotes political and social discussions about the space. The market can be seen as a territorialized market, as it stimulates political debate about the territory. The results gathered are part of reflections from the authors’ previous works, in which market access is understood as a form of struggle for territory, a way to make family farming known and recognized (Bourdieu, 2006) within the urban space.

Keywords: Rio da Prata Organic Market, Territorialized markets, Agriculture.


Submissão:
18  mar. 2024

Aceite:
31  out. 2024

Publicação:
09
 abr. 2025

Citação sugerida

FERREIRA, Fernanda da S.; GENARO, Ketyline P. Feira orgânica do Rio da Prata - RJ: um estudo sobre mercados territorializados. Revista IDeAS, Rio de Janeiro, v. 19, p. 1-23, e025001, jan./dez. 2025.

Licença: Creative Commons - Atribuição/Attribution 4.0 International (CC BY 4.0).


Introdução

O estudo dos mercados agroalimentares tem ganhado relevância nas Ciências Sociais, pois ajudam a entender as características de grupos específicos e suas influências nas vidas das pessoas. Inicialmente, as análises focaram nas relações de oferta e demanda, preços, concorrência e produtos. Hoje, o foco está na proximidade dos mercados, na qualidade dos produtos, nas alternativas aos mercados convencionais e na importância da relação entre produtores e consumidores. O presente artigo é um esforço de reflexão baseado nas dissertações de mestrado das autoras[1].

A viabilidade da agricultura está ligada ao mercado, apesar de haver várias interpretações sobre o conceito de mercado. No Rio de Janeiro, a agricultura urbana é discutida com o movimento agroecológico, que desenvolve alternativas mais justas para pequenos produtores, como feiras locais onde produtos orgânicos são vendidos. Esses mercados alternativos são formas de contestação social e política, aliados ao desenvolvimento territorial.

Nas Ciências Sociais, o território é visto como um espaço construído socialmente, fruto da apropriação humana e de suas dimensões afetivas, além de alvo de construções políticas e identitárias. Segundo Tartaruga (2005, p. 11), “o território deve ser determinado a partir do reconhecimento das relações de poder projetadas no espaço entre os diversos atores”, refletindo as relações sociais e aspectos simbólicos.

A relação com o mercado permite que agricultores se tornem representantes de outros produtores, ampliando a produção local. Um exemplo é o reconhecimento do Rio da Prata como a maior produtora de caqui no Rio de Janeiro, título reivindicado pela Associação de Agricultores Orgânicos da Pedra Branca.

Para esta pesquisa, foram usados métodos como observação participante, entrevistas e análise de fontes bibliográficas, além de trazer acúmulos de dados qualitativos coletados pelas autoras em pesquisas anteriores (Ferreira, 2017; Genaro, 2020).

Compreendeu-se que os mercados focados na venda direta e na relação produtor-consumidor trazem benefícios monetários e sociais e fomentam discussões politizadas. As feiras são espaços de expressão de identidade, cultura, relação com a natureza, tradição e saúde alimentar, funcionando como ferramentas de resistência da agricultura de pequena escala. No entanto, enfrentam dificuldades como quantidade, sazonalidade, aparência, transporte, preços e modos de pagamento (Ferreira, 2017; Genaro, 2020). O acesso ao mercado é, portanto, uma maneira de luta pelo território e reconhecimento da agricultura familiar na cidade (Bourdieu, 2006).

Feira Orgânica do Rio da Prata e a construção de feiras na cidade do Rio de  Janeiro

A referida feira foi criada em setembro de 2014 pelos agricultores da Associação de Agricultores Orgânicos da Pedra Branca (Agroprata),  juntamente com outras organizações, em um espaço privado, o Sítio Farol da Prata. Nos termos de Raffestin (1983), podemos pensá-la como um sistema sêmico, que expressa uma territorialidade, isto é, o modo como o território é apropriado pelos diferentes atores.
        Considera-se que as representações do território são importantes para a compreensão da feira e de seus significados, pois a partir da atuação de um conjunto de atores, vistos como atores sintagmáticos (Raffestin, 1983), projeta-se no espaço um território desejado.
        Em meio a essas relações é contada a história de resistência da pequena produção agrícola no maciço
[2] da Pedra Branca (Fernandez, 2009; Baptista, 2014; Prado, 2012; Oliveira, 2016) e as suas formas de existir em uma unidade de conservação em área urbana.
        Apesar do predomínio de representações urbanas, a região onde se encontram esses produtores, historicamente, teve um papel importante no abastecimento da cidade com hortifrutigranjeiros e ainda hoje mantém espaços agricultáveis. A resistência da ocupação de caráter rural-agrícola no maciço da Pedra Branca se faz diante de inúmeras dificuldades, tais como a sua transformação em Parque Estadual da Pedra Branca (PEPB), conforme demonstrou Fernandez (2009, p. 3) ao descrever: “o quadro de desinteresse do poder público em fomentar atividades agrícolas e o predomínio de um imaginário social de afirmação do urbano e de inexistência da agricultura na cidade do Rio de Janeiro”.
        Em outras palavras, essa resistência se traduz por meio do associativismo dos agricultores; do estabelecimento de parcerias em meio a redes sociais; da reorganização dos cultivos com bases agroecológicas, estimulada por mediadores; da participação no conselho consultivo do PEPB e em outros fóruns; aspectos esses que configuram formas de participação política do grupo.
        Ao encontro dos estudos do campo da sociologia econômica, é importante ressaltar a importância de pensar a resistência da agricultura familiar por meio da sua relação com o mercado.
        Um dos marcos do processo de construção das primeiras feiras orgânicas da cidade foi a criação, em 1979 – com registro feito em 1981 –, da Cooperativa dos Produtores e Consumidores de Alimentos, Ideias e Soluções Naturais (Coonatura-RJ). A decisão de criar uma cooperativa de produtos ecológicos foi tomada nesta formação inicial, na qual estava Paulo Aguinaga – produtor e morador da região do Brejal, em Petrópolis – que organizou os produtores do local, fazendo a integração campo-cidade (Ferreira, 2013).
        No caso dos sujeitos da pesquisa, antes da criação da primeira feira orgânica da Zona Oeste, alguns agricultores da região do rio da Prata estavam inseridos em feiras convencionais
[3], forneciam seus produtos para atravessadores ou comercializavam em pontos de venda próximos às residências.
        Ao passarem por um projeto de conversão orgânica, realizado pela ONG Roda Viva
[4], eles expressaram a vontade de acessar um mercado específico para produtos orgânicos. Assim, em parceria com o Sindicato Rural e a Emater, foi criada a Feira Orgânica de Campo Grande[5]. A instituição deste mercado não resultou na superação de problemas inerentes à comercialização de alimentos orgânicos, tampouco está próxima de alcançar esse feito. Mas contribuiu para conferir visibilidade para a agricultura familiar nessa área menos nobre da cidade, onde há um público ainda pouco sensibilizado para a questão do alimento orgânico.
        Conforme demonstrou Schultz (2006), a relação com o mercado exerce influência sobre a percepção dos produtores a respeito de suas identidades. A disseminação da produção orgânica, por exemplo, permitiu a ressignificação da identidade do agricultor, agregando valor aos produtores e aos produtos. Essa nova identidade abriu espaço também para a consolidação de mercados específicos. Mas, além dessa questão identitária, pode-se destacar outras formas de pertencimento que são afirmadas como meio de legitimação do grupo, como é o caso da identidade socioprofissional de agricultor familiar e a de camponês.
        Ao mencionar agricultura familiar e campesinato no espaço da cidade, foi considerado um amplo e extenso debate conceitual, sobre o qual não foi dada continuidade neste trabalho. Cabe definir a forma como são apropriados esses conceitos, fazendo uso das reflexões propostas por Carneiro (1998) e Wanderley (1996).
        Em uma definição breve, a agricultura familiar caracteriza-se por um núcleo de produção que relaciona família, terra e trabalho (Carneiro, 1998). Sendo assim, para  ter uma agricultura familiar não é necessário o desempenho do trabalho agrícola por toda a família, mas sim a manutenção de estratégias familiares para a manutenção da terra e da atividade agrícola. Por vezes, é possível encontrar apenas uma pessoa da família trabalhando diretamente com a terra, enquanto outros componentes do núcleo familiar exercem atividades econômicas de naturezas distintas.
        É importante ressaltar que existem continuidades entre o campesinato e a agricultura familiar. Como exemplo, é possível citar que em movimentos de agroecologia fala-se de uma agricultura de base camponesa, em que a racionalidade do acúmulo de capital não consiste em um objetivo principal. Isto é, mesmo que o ato de plantar não esteja dissociado do ato de vender, atribui-se mais importância para o local de venda, quem vende, o cuidado com a saúde alimentar e com o meio ambiente, dentre outras questões. Nesse sentido, confere-se ao ato de plantar uma dimensão politizada
[6]. Associada a isso está a história de resistência da agricultura de base camponesa.
        Além dessas categorias, torna-se cada vez mais proeminente entre os sujeitos da pesquisa a discussão sobre a agricultura urbana, que vem sendo afirmada a partir da atuação de movimentos de agroecologia na cidade do Rio de Janeiro, sobretudo, mediante a atuação da Rede Carioca de Agricultura Urbana
[7] – juntamente com outros coletivos e  atores sociais – a qual busca resgatar o histórico de ocupação agrícola da cidade e afirmar a persistência dessa prática em uma configuração urbanizada. Essa nova identidade procura interferir em políticas públicas[8] restritivas, dentro das quais as novas configurações da agricultura familiar não são reconhecidas em termos legais[9].
        
Prado (2012), em seu estudo realizado em meio à produção orgânica e agroecológica encontrada no maciço da Pedra Branca, demonstrou que a agricultura familiar é mais do que um modo de produção, pois expressa um modo de vida. Fernandez e Baptista (2014) observaram que suas características variam de acordo com os contextos nos quais é produzida, em virtude da sua capacidade de se reinventar diante das configurações dos territórios.
        Na vertente do Rio da Prata, do maciço da Pedra Branca, são destacados dois aspectos que caracterizam a agricultura: a baixa diversificação de produtos e a baixa adesão das novas gerações ao trabalho agrícola. Esses aspectos refletem o cenário mais amplo do maciço e podem ser explicados por diversos fatores, que vão desde as limitações do espaço e restrições impostas pela criação do PEPB, até as imposições do mercado.
        No Rio da Prata, dois produtos assumem grande relevância na composição da renda das famílias, que podem ser encontrados em mais quantidade, e demandam pouco manejo e emprego de mão de obra, são eles: a banana e o caqui. Ademais, outros produtos também são cultivados, com vistas ao autoconsumo e à comercialização.
        
Na Figura 1, pode-se perceber a predominância de áreas urbanizadas sobre a área verde, englobada pela unidade de conservação.

Figura 1 – Limites do Parque Estadual da Pedra Branca e seu entorno urbano


Fonte: Iwama; Pellin (2014).

Antes da criação do PEPB, muitos agricultores das partes baixas do maciço foram obrigados a vender suas terras por pressões do capital ou ameaças. Mas a história de resistência da agricultura ali encontrada remete à existência na região de ligas camponesas que lutavam pelas terras. Santos (2006) demonstrou que durante as décadas de 1950 e 1960, quando a expansão urbana estava em pleno avanço sobre a antiga zona rural, ligas camponesas, compostas por produtores de diferentes vertentes do maciço, enfrentaram violentos conflitos na luta pela terra.
        De acordo com Fernandez (2014, p. 5),

neste processo de luta, o termo camponês foi outra categoria política apropriada pelos lavradores cariocas e lhes permitia identificarem-se como aqueles que lutavam pelo direito à terra e que faziam parte das ligas camponesas. 

A autora ressalta que a inserção de agricultores cariocas  em processos de luta das ligas camponesas, cuja atuação ficou marcada em diversos estados do Brasil – sobretudo no Nordeste –, apresenta uma singularidade no caso fluminense “pois na base dos conflitos está não o latifúndio e o ‘atraso’, mas o processo de urbanização” (ibidem).

Se, por um lado, o avanço urbano fez recuar a pequena produção agrícola da região, por outro, a criação da unidade[10] de conservação introduz conflitos de outra ordem. Com a criação do PEPB, em 1974, foram impostas diversas restrições sobre as formas tradicionais de ocupação e uso do solo.

Alguns dos agricultores que ali haviam se estabelecido com suas culturas, permaneceram e progressivamente tiveram que adaptar suas atividades produtivas às restrições crescentes impostas pelos órgãos ambientais responsáveis pela administração do PEPB. Podem ser citadas: a proibição de roçar os terrenos, de fazer queimadas, de expandir as áreas cultivadas, de fazer melhoria nos caminhos ou utilizar meios de transporte mais modernos. O maciço da Pedra Branca produz, por exemplo, banana e caqui em escala comercial e toda a produção é transportada ainda hoje pelos burros que sobem e descem seus caminhos íngremes. Tais restrições tornam a atividade agrícola no Maciço ainda mais penosa e limitam as possibilidades de expansão da produção ou de introdução de novos cultivos (Fernandez, 2009, p. 27-28).

O estudo que legitimou a criação da unidade de conservação reconhece uma agricultura incipiente, que não consegue fazer frente ao crescente processo de urbanização. Fernandez (2009) descreve que os efeitos da criação do PEPB sobre a agricultura local são contraditórios, pois a prática agrícola é vista pelos atores locais como a grande responsável pela manutenção da área protegida. Mas o Estado, orientado por concepções conservacionistas, criminaliza as atividades exercidas pelos agricultores por parte dos agentes ambientais[11].
        
Além das limitações impostas pelo Instituto Estadual do Ambiente (Inea)[12], órgão responsável pela gestão da unidade de conservação, a invisibilidade da agricultura[13], expressa pelo Plano Diretor da cidade, dificulta o acesso a políticas públicas voltadas para a agricultura familiar, agravada pelo abandono do poder público e sucateamento de agências extensionistas, como a Emater-Rio. Em síntese, se por um lado a criação do PEPB explicita ideais conservacionistas (Fernandez, 2009), que visam à construção de espaços de lazer urbano e, também, de preservação da natureza, ainda muito influenciados pelo “mito da natureza intocada” (Diegues, 2002), apostando na incompatibilidade entre conservação da natureza e permanência humana, por outro, é possível observar uma recente mudança nos discursos[14] da gestão vigente da unidade de conservação, admitindo – ainda de modo incerto – a presença da agricultura[15] e concebendo a possibilidade desta ser aliada na conservação ambiental.
        Nesse contexto, a criação da Feira do Rio da Prata permite pensar as estratégias do grupo de agricultores locais, de maneira contextualizada com o cenário mais amplo do maciço da Pedra Branca, no qual se encontram grupos de mobilização política com atuação no território. Entendendo as estratégias de construção e o acesso ao mercado como formas de resistência, busca-se compreender como a Feira se apresenta sob a ótica dos próprios atores que participam dela.
        Portanto, a Feira Orgânica do Rio da Prata não é entendida apenas como um ponto de comercialização de produtos orgânicos, mas como um espaço social, no qual as relações sociais expressam significados sobre o território, identidades e conflitos.
        O mapeamento dessas relações foi feito no próprio local onde a feira é realizada. Para além das atividades comerciais, foram analisados eventos nos quais as lideranças da Agroprata tornaram públicas as dificuldades e os desafios enfrentados pelos produtores da região e conferiram importância às relações sociais estabelecidas entre diferentes atores – muitas vezes apresentados como “parceiros”.
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Compreendendo o mercado territorializado

Os mercados cada vez mais representam um aspecto importante da literatura sobre campesinato e agricultura familiar[16]. Do ponto de vista sociológico, os agricultores familiares representam uma forma social específica, formada por um núcleo de interação familiar, ligada por laços de parentesco, situada em espaço geográfico definido e que mantém estreita relação com a terra e outros meios de produção, assim como outras unidades familiares e grupos sociais. Essa definição de agricultura familiar também pode ser aplicada a outras categorias, como camponeses e pequenos produtores (Schneider, 2016).
        De acordo com Wanderley (2000), esse modelo de produção pode ser englobado pelo conceito de agricultura familiar, tendo em vista que este engendra uma diversidade de situações, experiências e relações com a sociedade global. Nas palavras da autora, o campesinato, mesmo tendo perdido a significação e a importância que tinha nas sociedades tradicionais, continua a se reproduzir nas sociedades atuais integradas ao mundo moderno” (Wanderley, 1996, p. 7). Lê-se que o camponês, em sua relação com o mercado, visa criar um sistema econômico no qual possa ter autonomia, diante de ambientes desfavoráveis aos poucos recursos de que dispõem.
        Gazolla e Pelegrini (2010) também destacam a autonomia dos agricultores familiares na construção de estratégias para manter seus meios de vida, as quais atravessam o tema dos mercados. No que tange a essas estratégias, pode-se destacar o encurtamento da distância entre produção e consumo e o estabelecimento de relações diretas entre produtores e consumidores.
        Brandenburg, Lamine e Darolt (2015) mostram que as novas relações impostas pela modernização da agricultura, a partir das décadas de 1960 e 1970, trouxeram uma nova dinâmica para a cidade e para os processos econômicos, que culminaram na invisibilidade do campesinato, diante da proeminência de modos de vida urbanos e novas racionalidades de produção.
        De acordo com Fernandez e Santos (2015), é necessário combater a ideia de desaparecimento do campesinato e descrever a sua capacidade de resistir e se reinventar ao longo do tempo. Como exemplo dessa resistência, os mercados orgânicos e agroecológicos se apresentam como novas possibilidades à agricultura familiar ou “agricultura de base camponesa”
[17], em um ambiente de politização.
        Diante disso, destaca-se a importância de entender essa relação, tendo em vista que a viabilidade da pequena produção agrícola e a reprodução social dos produtores depende de sua inserção no mercado. Certamente, nem todo mercado apresenta configurações viáveis para a agricultura em pequena escala. Por esse motivo, cabe avaliar suas características, contextos e conjunturas socioeconômicas.
        Olhando para os mercados como expressão e resultado das relações entre indivíduos, lidas a partir do conceito de redes sociais, enfatizou-se os que privilegiam a relação direta entre produtor e consumidor, como é o caso das feiras de produtos orgânicos/agroecológicos encontradas na cidade do Rio de Janeiro.
        Deve-se notar que existe um consenso em torno da ideia de que a viabilidade da agricultura depende da sua relação com o mercado. Já a compreensão sobre o que é o
mercado não é consensual, pois abre margem para diversas interpretações.

Muitas vezes, os mercados transparecem como expressão que remete a uma entidade abstrata, com valores e motivações próprios, capazes inclusive de predizer o comportamento social. O mercado aparece como um ente exterior que precisa ser ouvido, respeitado e, por vezes, acalmado. Em outras ocasiões, a noção adquire um sentido mais concreto, revelando-se um espaço de interação onde ocorrem trocas, diálogos, negociação, conflito, compra e venda. Este é o caso das feiras, das mercearias, dos supermercados e das casas comerciais, etc. Seja qual for o entendimento, os mercados possuem importância crucial na vida das pessoas, contribuindo para definir amplas esferas da organização social, política e cultural das sociedades (Schneider et al., 2016, p. 11).

Tendo em vista as variações de significados atribuídos aos mercados, tal categoria é comumente utilizada no plural pela sociologia econômica. Neste campo, uma das principais contribuições teóricas[18] remete a Polanyi (2000 apud Schneider et al., 2016), por romper com a ideia de que economia e relações sociais são universos “alheios”. Para o autor, os mercados são produtos de relações sociais dinâmicas.
        Já Granovetter (1985 apud Wilkinson, 2016), considera que

Todos os tipos de mercados recebem influências de relações sociais e só podem ser caracterizados a partir das mesmas. Na perspectiva deste autor, ganha destaque o papel das redes sociais na seleção de informações, possibilidades de trocas e relações de confiança.

De acordo com Fligstein e Dauter (2012), alguns mercados atuais são caracterizados por uma permanente comparabilidade com movimentos sociais, por estarem sujeitos a novos entendimentos. Um dos esforços que distinguem os novos movimentos sociais econômicos é o de redefinir a relação entre produtor e consumidor, apostando em redes alternativas de comércio que trabalham em cima da articulação direta entre grupo de produtores, distribuidores, mercados dedicados e consumidores. Tal articulação é característica de mercados locais e, segundo Wilkinson (2016), é esse o caráter de redes sociais expresso nos mercados.
        Na sociologia econômica, frequentemente, os mercados aparecem polarizados em dois blocos: os mercados convencionais e os mercados alternativos – também chamados de mercados locais ou mercados enraizados (Marques
et al., 2016). Nos primeiros, a quantidade de produtos e as relações entre oferta e demanda são aspectos de mais relevância; enquanto nos segundos, há uma valorização da qualidade do produto, do local de venda, da cultura e da tradição.
        No Brasil, com a emergência de redes agroalimentares alternativas e do movimento de agricultura ecológica, nos anos 1990 (Brandenburg
et al., 2015), ganham destaque as críticas às grandes cadeias produtivas e às redes de comercialização que conformam os mercados convencionais. Assim, os mercados alternativos foram criados em decorrência das consequências da modernização da agricultura, dos impactos ambientais e sobre a saúde alimentar, ocasionados pelo uso de agrotóxicos na agricultura convencional.
        Nessa ótica, os mercados alternativos são apresentados também como mercados locais, onde as lógicas de funcionamento não são, necessariamente, orientadas para a obtenção de lucro. Isto é, nestes, o lucro é uma consequência e não o objetivo principal; diferentemente dos mercados convencionais, cujas relações econômicas visam a maximização do lucro.
        Ao contrário dos mercados convencionais, nos alternativos há mais preocupação com as condições locais da produção, remetendo a uma dimensão mais politizada. Assim, podem assumir significados que os aproximam dos novos movimentos sociais econômicos, conferindo-lhes um caráter de reivindicação social. Além disso, são apresentados como potenciais aliados do desenvolvimento rural.
        De fato, mercados convencionais e alternativos apresentam singularidades e são orientados por ideologias distintas, mas não são mundos hostis (Zelizer, 2005), na medida em que as regras de funcionamento de cada um desses circuitos (certificações, qualidade, padrões de funcionamento, preços etc.) podem contaminar um ao outro.
        Uma vez que o acesso ao mercado é um aspecto importante para a manutenção da atividade agrícola em pequena escala, no caso do Rio de Janeiro, a existência da agricultura na cidade vem sendo discutida com o movimento agroecológico, sendo elaboradas alternativas mais viáveis e justas para os pequenos produtores em suas relações econômicas. Tais medidas acenam para a construção de feiras locais, onde são comercializados os produtos orgânicos em diferentes bairros da cidade.
        Com a introdução do produto orgânico em mercados convencionais (em redes de supermercados e lojas, por exemplo), as condições de aquisição desse alimento foram facilitadas. Porém, para os pequenos produtores, são colocadas diversas dificuldades de fornecimento, tais como exigências de quantidade, sazonalidade, aparência do produto, condições de transporte, preços, formas de pagamento, entre outras.
        Diante disso, ficou ainda mais claro que a melhor alternativa para a pequena produção agrícola são os chamados circuitos curtos, considerados uma forma de comercialização mais vantajosa para os pequenos e médios produtores, por visar à diminuição da distância entre produtor e consumidor, valorizar a produção local e propor outros princípios de relações, questionando o modelo convencional (Bava, 2011). A definição de circuito curto teve um desenvolvimento mais amplo na França do que no Brasil, pois aqui ainda é preciso ir adiante para estabelecer uma definição mais clara. Ainda  assim, os dois casos têm uma característica em comum: ambos os circuitos curtos são majoritariamente alimentados pela agricultura familiar (Darlot, 2013).
        Os mercados alternativos podem ser lidos a partir da ideia de contestação social e política, sendo vistos também como potenciais aliados do desenvolvimento territorial. De acordo com Rocha
et al. (2014, p. 1):

Os espaços rurais têm passado por mudanças significativas nos últimos anos, impulsionadas pelas próprias dinâmicas capitalistas. A reestruturação do capitalismo gera transformações no rural, que passa a assumir diferentes dimensões, com uma diversificação de suas atividades, gerando configurações locais específicas. Nesse contexto, a agricultura familiar utiliza uma gama variada de estratégias para asua reprodução e valorização do seu patrimônio familiar, estratégias essas que têm apresentado dinâmicas diferentes nos últimos anos, impulsionada por uma série de transformações no próprio espaço rural e na sua interação com o meio urbano. É nesse cenário que emerge a discussão sobre as redes locais de produção, enquanto estratégias de fortalecimento da agricultura familiar, na perspectiva do desenvolvimento territorial. As redes locais de produção, na medida em que articulam iniciativas no sentido da constituição de um circuito próprio de relações (não apenas econômicas, mas também envolvendo experiências, saberes e valores), favorecem o desenvolvimento territorial. Nessa perspectiva, o desenvolvimento assume um caráter multidimensional (não se limitando aos aspectos econômicos) e endógeno (baseado nas demandas e potencialidades locais).

As redes locais, articulando produtores e/ou consumidores, têm sido consideradas uma estratégia para o fortalecimento da agricultura familiar, que tem como um dos seus principais desafios a inserção nos mercados capitalistas, pautados na lógica produtivista (p. 2).

O encurtamento da distância entre produtor e consumidor, que marca os chamados circuitos curtos de comercialização, contrasta com o distanciamento dessa relação provocado pelas iniciativas de grandes corporações. Esta tendência também pode ser observada em alguns nichos de comercialização do alimento orgânico, muitas vezes tornado objeto de especulação no mercado, conforme observou Schmitt (2011). Esse fato carrega, em contrapartida, um questionamento acerca do caráter concentrador e excludente do mercado capitalista.
        De acordo com Rocha
et al. (2014, p. 4), “as características desse sistema hegemônico criam um conjunto de barreiras para a participação da agricultura familiar”. Em relação às redes agroalimentares alternativas, pode-se citar que:

paralelo ao avanço da padronização dos produtos e dos processos produtivos, liderado por multinacionais, cresce um movimento contrário, estimulado pelas próprias consequências negativas de um modelo de desenvolvimento produtivista (Rocha et al., 2014, p. 5),

        Esses mercados podem ser chamados de mercados territorializados, isso porque não se trata apenas de troca de mercadorias, mas do acionamento de um debate político que envolve a reflexão sobre o ciclo produtivo até o consumo desse alimento. Os mercados territorializados se contrapõem às grandes cadeias alimentares, a comida que não se sabe de onde vem, ultraprocessada e com agrotóxico, advinda dos circuitos longos de comercialização. Esses circuitos são considerados “modernos” por conta das técnicas de agroindustrialização dos alimentos e a procura por eles é intensa nas cidades. Apenas a partir da década de 1990 que, preocupada com os efeitos nocivos à saúde humana e ao meio ambiente, a população passa a gerar uma demanda pela produção de alimentos orgânicos (Maia; Souza, 2016). Esse tipo de mercado também permitiria mais autonomia de produção, fazendo com que o agricultor tivesse melhor controle sobre o que produz, além da previsibilidade de investimento necessário, levando em conta os recursos naturais disponíveis e a sua utilização justa.
        Segundo Fernandez (2019), falar em mercado territorializado é uma forma de deixar implícito os princípios agroecológicos que estão nele imbricados, já que não há como pensar em agroecologia
[19] sem pensar em território. Uma das possíveis definições de território, como uma categoria de análise, destaca as dimensões locais, os laços econômicos, políticos e simbólicos que vinculam grupos sociais a um espaço determinado. Em grande medida, há uma correspondência entre essa categoria de análise e o território como categoria da prática, já que a crescente ênfase na utilização do conceito de território reflete as transformações empíricas impostas por mobilizações sociais e também seus efeitos sobre a política (Fernandez, 2019). Ademais, os mercados são espaços de resistência e afirmação de identidades, na medida em que rompem com regras e convenções de mercado e criam práticas alternativas de garantia de sobrevivência (Fernandez, 2019).
        Vimos que esses mercados são instrumentos de resistência, pois além de subsidiarem economicamente a vida desses agricultores – que têm com essa produção não só alimentos para venda, mas também para consumo próprio –, acionam esse debate territorial que convida a olhar para os significados políticos e simbólicos do produto comercializado. Em conversa mantida em campo com uma agricultora foi dito que: “existe a ideia de que no campo se trabalha muito e ganha pouco, só que eles não veem o que a gente deixa de gastar em supermercados, farmácias...”, se referindo à um olhar de fora que não percebe os pormenores econômicos que os agricultores vivenciam, ou seja, entendem que é um trabalho árduo e de pouco retorno financeiro, mas deixam de olhar para as benesses de, em muitos casos, poder encontrar alimento e remédio diretamente nos seus cultivos. Existe uma gama de equilíbrios no trabalho no campo (Ploeg, 2016) que nem sempre é percebida por quem está de fora, trabalhando para o mercado formal. Para o autor, o equilíbrio se relaciona à produção total de uma unidade de produção agrícola, isso inclui o que é vendido e o que é consumido, as necessidades que não conseguem ser supridas pela sua própria produção, seriam então compradas nos mercados com dinheiro da comercialização dos seus produtos, e para ele é impossível no mundo antigo e no de hoje, reproduzir a família e a propriedade sem os mercados. De fato, quando se vai a campo percebe-se que não há uma unidade de produção que seja autossustentável, no entanto, valendo-nos também da fala citada anteriormente, vê-se que não se trata apenas do  que se produz, mas do que se deixa de precisar comprar.
        Para Chayanov (1996, p. 41,
apud Ploeg, 2016), “o coração pulsante de toda unidade de produção camponesa é o equilíbrio trabalho-consumo”, referindo-se à demanda de consumo dentro da família e à força de trabalho disponível também dentro dela. Ao pensar novamente nos circuitos curtos de comercialização, pode-se observar que este equilíbrio entre trabalho e consumo é muito importante. Diferente de quando ele cultiva direcionado aos mercados convencionais que o obriga a produzir em grande escala e apenas um cultivo, o circuito curto permite que ele tenha autonomia sobre o que plantar, quanto plantar e quando plantar. Em contrapartida, isso é retroalimentado pelo consumidor que escolhe fazer um consumo político dessa produção sabendo que está fomentando esse modo de vida.
        O circuito curto é uma forma de fazer funcionar esse equilíbrio analisado por Chayanov (1996
apud Ploeg, 2016). Assim, esses mercados tornam-se instrumentos de resistência justamente por permitirem que o agricultor possa continuar vivendo de sua produção em equilíbrio. No entanto, não se pode acreditar inocentemente que esse equilíbrio de trabalho-consumo seja facilmente alcançável apenas pela comercialização em circuitos curtos, a noção de que o trabalho na terra é um trabalho árduo não difere da realidade. Em campo, foi possível acompanhar o quão exaustiva essa atividade pode ser, longas jornadas de trabalho e uma prática que se estende até uma idade avançada; e nas feiras, foram encontrados homens e mulheres idosos comercializando seus produtos. Talvez seja possível encontrar, em certa medida, o equilíbrio naquilo que se deixa de gastar, tanto por ter a própria produção – embora não seja autossustentável – quanto pelo sistema de trocas. Há um sistema de trocas, principalmente de plantas medicinais, que envolve também uma troca de conhecimento, e faz com que os gastos farmacêuticos sejam diminuídos, pois o intercâmbio de ervas é algo considerável entre os agricultores. É preciso ressaltar que pelas condições históricas de evolução das agriculturas cariocas, ainda que sempre possa existir os cultivos ligados à subsistência e ao autoconsumo, as agriculturas foram progressivamente se especializando em alguns produtos que exigiam menos força   de  trabalho, e que tinham boa aceitação no mercado, tais como a banana, o caqui e o aipim. Na atualidade, portanto, um dos aspectos de revitalização desta agricultura trazida pelos mercados agroecológicos tem sido a introdução progressiva de cultivos diversificados para abastecer os mercados locais.
        Deste modo, pode-se afirmar que os mercados alternativos expressam as estratégias de resistência da agricultura familiar. E como exemplo dessa resistência, pode-se mencionar a (re)construção da identidade socioprofissional dos agricultores que atuam na produção orgânica (Schultz, 2006). Nas palavras do autor,

Na comercialização em feiras, a valorização da atividade profissional ocorre na relação direta com os consumidores, a partir da geração de credibilidade baseada na confiança e na ética profissional dos agricultores (Schultz, 2006, p. 24).

Em síntese,

Independentemente do tipo de relações de mercado que sejam estabelecidas, a agricultura orgânica, a partir da redefinição de seus modos de produção, pressupõe a possibilidade de os agricultores buscarem, através da sua atividade profissional, a (re)construção de sua identidade. As principais modificações se apresentam nas relações técnico-produtivas, e, consequentemente, no sentido das atividades relacionadas ao próprio trabalho, ou seja, na “prática” da agricultura orgânica. Entretanto, também se destacam a construção de novas relações sociais, para ainda além das do próprio mercado, que influenciam, entre outros aspectos, a profissionalização dos agricultores. Trata-se do surgimento de novos atores sociais detentores de reivindicações, que passam a ser legitimadas dentro do atual contexto de crise do modelo convencional de produção agrícola (ibidem, p. 20).

Assim, a produção orgânica, mais do que um “nicho de mercado”, cria novos significados para a produção de alimentos, incorporando diferentes dimensões a partir das relações estabelecidas com o mercado. É justamente a possibilidade de interação entre produtores e consumidores que configura um mercado diferenciado, gerando novos valores (Rocha et al., 2014, p. 6).

Considerações finais

No âmbito das Ciências Sociais, o território é entendido como um espaço socialmente construído, que resulta da apropriação humana e de suas dimensões afetivas. São alvos de construções políticas, da perspectiva identitária, objeto de reivindicação e palco de ações coletivas. De acordo com Tartaruga (2005, p. 11), “o território deve ser determinado a partir do reconhecimento das relações de poder projetadas no espaço entre os diversos atores”. Sendo, portanto, resultado das relações sociais existentes em um dado espaço e seus aspectos simbólicos. Na perspectiva do governo, o território assume uma dimensão física, constituindo a base que sustenta essas relações.
        A inserção econômica da Zona Oeste no mercado local e nacional foi marcada por diferentes ciclos de atividades mercantis (Musumeci, 1988): fornecimento de carvão e lenha para os mercados locais; especificamente, na região do Rio da Prata, o caráter da economia era basicamente extrativista, onde havia uma preocupação maior com os danos causados por essa atividade ao meio ambiente.
        Compreendeu-se que a partir da relação com o mercado, os agricultores tornam-se porta-vozes dos demais produtores, e este fato tem conferido amplitude para a pequena produção local. Além disso, essa interação corrobora o sentido de entender que este mercado, a partir da influência dos atores, se constrói de características que representam a agricultura local, de forma que assume o papel de fazer frente às atividades produtivas e à própria existência da agricultura. Como exemplo, destaca-se o reconhecimento da região do Rio da Prata como maior produtora de caqui da cidade do Rio de Janeiro. Reivindica-se, para a Associação de Agricultores Orgânicos da Pedra Branca tal título.
        Com base em ambas as perspectivas – compreendendo que não há território sem espaço físico e relações sociais –, o Rio da Prata é percebido como passível de apropriações distintas e palco de disputas, tanto por parte de órgãos oficiais como por parte dos sujeitos locais. Tais disputas estão expressas nas ações desenvolvidas no plano territorial.
        Em linhas gerais, está se considerando que a abertura de mercados alternativos de orgânicos, juntamente com a afirmação da identidade socioprofissional de agricultor orgânico, por si só já é uma expressão da resistência dessa agricultura diante do quadro de invisibilidade encontrado no município do Rio de Janeiro. Deve-se notar que a consolidação desses mercados ocorreu por meio da construção de feiras orgânicas, tendo como cerne a venda direta e a relação entre produtor e consumidor.
        Embora, como encontra-se na teoria, os mercados alternativos não tenham como objetivo principal o lucro, o reconhecimento dessa produção leva os agricultores não apenas ao lucro monetário mas à possível obtenção de benefícios de cunho social além de fomentar a discussão desses espaços politizados. Sabendo que essa agricultura existe e está inserida no circuito mercadológico da cidade, pode-se abrir o diálogo para pensar nas formas de habitar e produzir neste local. Não obstante, com a projeção da associação, projetos e sujeitos institucionais têm feito parte do cotidiano dos agricultores do Rio da Prata, inseridos na associação. Além da aproximação com a base institucional, há que se destacar a relação que se constrói e se desenvolve com os movimentos sociais do campo e da cidade. Como resultado disso, destaca-se o fortalecimento da identidade de agricultor orgânico, sobretudo com a possibilidade de atuação em feiras específicas e mercados próprios, onde a relação entre produtor e consumidor agrega valor a essa prática.
        As feiras são o espaço de realização dos produtores-comerciantes, não apenas no aspecto econômico. Isto é, a agricultura orgânica não deve ser percebida somente por sua relação com o mercado, como “mercadoria”, mas, antes, como um produto que exprime a dimensão identitária, uma cultura, a relação com a natureza e a sua conservação, a tradição o cuidado com a saúde alimentar. Nisso consiste o caráter multifuncional da agricultura. Além de fomentar este caráter, as feiras funcionam como uma ferramenta que permite a resistência material desta agricultura, de modo que elas são parte importante para a manutenção da atividade agrícola de pequena escala, uma vez que, muitas vezes, o sustento do pequeno produtor é retirado desta ferramenta de comercialização. Percebe-se, portanto, que a feira se torna um espaço político-pedagógico, no sentido de que ela funciona como um canal de comunicação e aproximação do agricultor com o comprador em que signos e pautas são acionados e, ao mesmo tempo, carregam o caráter  monetário que também é político, pois respalda a existência dessa agricultura. Dessa forma, no espaço da feira, é como se agricultor e comprador se retroalimentassem por meio de uma troca que está além de produtos e dinheiro, mas que mostra o que esses produtos e a escolha deles significam.
        Por outro lado, as feiras carregam dificuldades no seu próprio funcionamento, questões com quantidade, sazonalidade, aparência, transporte, preços, formas de pagamento, entre outras, não deixam de existir e são parte integrante do que caracteriza este mercado. Essas dificuldades se impõem tanto ao produtor-comerciante quanto ao comprador.
        Por fim, é possível entender que o acesso ao mercado se traduz como uma forma de luta pelo território, de fazer conhecer e reconhecer (Bourdieu, 2006) a agricultura familiar no espaço da cidade.

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Fernanda da Silva Ferreira

Mestra pelo Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (PPGCS/UFRRJ). Coordenadora Pedagógica desde 2021 e Professora de Sociologia e Filosofia da Secretaria de Estado de Educação do Rio de Janeiro (SEEDUC-RJ) desde 2015. Graduada em Ciências Sociais (Licenciatura) pela UFRRJ em 2014.

E-mail: ferreiras.fernanda@gmail.com

Lattes: http://lattes.cnpq.br/5881039538420969

ORCID: https://orcid.org/0009-0008-0092-0727

Ketyline Pimenta Genaro 

Doutoranda em Sociologia pelo Programa de Pós-Graduação em Sociologia, da Universidade Federal Fluminense (financiamento Capes). Mestre em Ciências Sociais pelo Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais, da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) e Bacharel em Ciências Sociais (bolsista PROEXT e Faperj) na mesma instituição. Membro do grupo de pesquisa Fronteiras.
E-mail: ketylinepg@id.uff.br
Lattes: https://lattes.cnpq.br/2074690870237911

ORCID: https://orcid.org/0000-0001-7660-727X

Revista IDeAS, Rio de Janeiro, volume 19, 1-23, e025001, jan./dez. 2025 • ISSN 1984-9834


[1] Dissertação de mestrado de Fernanda da Silva Ferreira: https://rima.ufrrj.br/jspui/bitstream/20.500.14407/11439/3/2017%20-%20Fernanda%20da%20Silva%20Ferreira.Pdf. Dissertação de mestrado de Ketyline Pimenta Genaro: https://rima.ufrrj.br/jspui/bitstream/20.500.14407/11450/3/2020%20-%20Ketyline%20Pimenta%20Genaro.Pdf.

[2] “Maciço” é a denominação utilizada para um conjunto de montanhas dispostas em torno de um ponto culminante. O maciço da Pedra Branca abriga o ponto mais alto da cidade, o pico da Pedra Branca, com 1.024 m de altitude (Oliveira, 2016).

[3] Souza (2017, p. 13) descreveu que as feiras convencionais foram as primeiras a funcionar na cidade do Rio de Janeiro. A maior parte dos produtos comercializados corresponde à hortifrutigranjeiros, gerados por meio de uso intensivo de insumos sintéticos, tais como fertilizantes e agrotóxicos.

[4] A ONG Roda Viva não tem um perfil de atuação voltado para atividades agrícolas. O projeto desenvolvido por esta ONG com os produtores da Agroprata foi intermediado por uma participante da ONG que realizava atividades sobre a qualidade da água dos rios com jovens da região. Ao entrar em contato com os produtores locais, sensibilizou-se com as condições de vida e propôs a elaboração de um projeto desenvolvido pela mesma ONG, mas com recursos repassados pela ONG Rockfeller (Fernandez, 2009; Leal, 2005). De acordo com o folheto de divulgação do projeto da ONG Roda Viva, divulgado em julho de 2002, dezenove agricultores passaram por este processo de formação em produção orgânica (Fernandez, 2009, p. 307).

[5] Alguns desses agricultores, a despeito da produção orgânica e comercialização em mercados específicos, mantiveram seus pontos de comercialização em feiras convencionais.

[6] Nessa direção estão voltadas às práticas de vendas diretas, os circuitos curtos, o alimento limpo,  as relações de confiança, a política territorial em vez da política setorial, as sociabilidades, a relação campo-cidade etc.

[7] A Rede Carioca de Agricultura Urbana, consolidada em 2009, é um coletivo que engloba associações, instituições, organizações, grupos e indivíduos engajados na luta pela agricultura nas cidades. O pertencimento à rede, contudo, é um permanente processo de construção e reconstrução, de acordo com as agendas, necessidades de representação etc. Segundo Prado (2012, p. 63): “A Rede Carioca de Agricultura Urbana funciona como um espaço que busca a valorização das práticas dos agricultores e da incorporação crescente de princípios agroecológicos em seus manejos agrícolas. Essa articulação tem sido construída a partir de diversos encontros entre agricultores e agentes sociais ligados à Articulação de Agroecologia do Rio de Janeiro [...].”

[8] Como exemplo de ações de reivindicações de políticas públicas voltadas para a agricultura, foi articulado um grupo, formado por representantes da Rede Carioca de Agricultura Urbana, da AS-PTA (Projeto Semeando Agroecologia), do Profito (Farmanguinhos/Fiocruz), da Rede Ecológica (grupo de compras coletivas de produtos orgânicos), em parceria com os agricultores do maciço da Pedra Branca, que ficou conhecido como Mutirão Pró-DAP. Neste, buscou-se identificar os agricultores que poderiam consultar a Declaração de Aptidão ao Pronaf (DAP) – documento que possibilita o acesso às políticas de compras governamentais. O diagnóstico das propriedades e o enquadramento urbano foram aspectos restritivos para muitos produtores.

[9] Entendendo a DAP como um documento que legitima a agricultura familiar, tem-se como critérios legais: “Conforme a Lei nº 11.326/2006, é considerado agricultor familiar e empreendedor familiar rural aquele que pratica atividades no meio rural, possui área de até quatro módulos fiscais, mão de obra da própria família, renda familiar vinculada ao próprio estabelecimento e gerenciamento do estabelecimento ou empreendimento pela própria família. Também são considerados agricultores familiares: silvicultores, aquicultores, extrativistas, pescadores, indígenas, quilombolas e assentados da reforma agrária” (MDA, 2016. Disponível em: http://www.mda.gov.br/sitemda/noticias/o-que-%C3%A9-agricultura-familiar, Acesso em: jun. 2017.

[10] A criação da unidade de conservação insere um conjunto de restrições e desafios à manutenção de modos de vida agrícolas (Fernandez, 2014). Pensar a relação com o PEPB é relevante no estudo sobre a Feira Orgânica do Rio da Prata, pois grande parte da produção é feita na área protegida, assim como a própria feira é realizada próxima aos limites da unidade de conservação.

[11] Como exemplo da relação de conflito socioambiental, alguns agricultores foram notificados pelo órgão gestor do parque e coagidos a assinar documentos de ciência dos impedimentos quanto ao uso dos recursos naturais nos limites do PEPB.

[12] Outrora Instituto Estadual de Floresta (IEF), transformado, em janeiro de 2009, em Instituto Estadual do Ambiente (Inea).

[13] Diante desse cenário de invisibilidade e restrições, ganha força o movimento de agricultura urbana, por meio da articulação de redes sociais, a fim de buscar políticas públicas que atendam às particularidades dessa agricultura que se faz em meio à cidade.

[14] As mobilizações políticas de agricultores em meio a redes sociais garantiram a sua representação no Conselho Consultivo do Parque Estadual da Pedra Branca e em outros fóruns. Em reuniões do         conselho, por  meio de relatos de moradores acerca de ameaças indiretas, além de uma reportagem de jornal local, ou seja, em diversos momentos, foi possível identificar discursos que defendiam a retirada de famílias dos limites da unidade de conservação. Mais recentemente, em 2016, no II Encontro Científico do Parque Estadual da Pedra Branca, que reuniu pesquisadores de diversas áreas, os discursos dos gestores do PEPB acenaram para o estabelecimento de uma parceria entre o Instituto Estadual do Ambiente (Inea) e as populações tradicionais.

[15] As mobilizações políticas de agricultores em meio a redes sociais garantiram a sua representação no Conselho Consultivo do Parque Estadual da Pedra Branca e em outros fóruns. Em reuniões do         conselho, por  meio de relatos de moradores acerca de ameaças indiretas, além de uma reportagem de jornal local, ou seja, em diversos momentos, foi possível identificar discursos que defendiam a retirada de famílias dos limites da unidade de conservação. Mais recentemente, em 2016, no II Encontro Científico do Parque Estadual da Pedra Branca, que reuniu pesquisadores de diversas áreas, os discursos dos gestores do PEPB acenaram para o estabelecimento de uma parceria entre o Instituto Estadual do Ambiente (Inea) e as populações tradicionais. Em 2014, duas comunidades do maciço da Pedra Branca foram certificadas, pela Fundação Palmares, como quilombolas, a saber: o Quilombo Cafundá Astrogilda e o Quilombo do Camorim (Ver Oliveira, 2016). Desde 2017, está em processo de reconhecimento de mais uma comunidade quilombola, na vertente do Rio da Prata, nomeada Comunidade Remanescente de Quilombola Dona Bilina.

[16] Conforme mencionamos na introdução, trabalhamos com ambos os conceitos. Tratamos, em específico, de uma agricultura familiar que tem como eixo central a relação entre família, terra e trabalho (Carneiro, 1998). Considerando que o conceito de agricultura familiar abarca diferentes realidades; o de campesinato, englobado pelo primeiro, acena para os objetivos da atividade econômica, para as experiências da sociabilidade e as relações externas dessa agricultura com o mundo global (Wanderley, 1996).

[17] Termo utilizado pelo movimento agroecológico.

[18] Não é a intenção apresentar uma revisão das diferentes vertentes da sociologia econômica que discutem o mercado, pois existem trabalhos brilhantes que dão conta dessas questões (ver Wilkinson, 2008, 2016).

[19] Agroecologia e território, na verdade, são elementos indissociáveis, já que a prática agroecológica implica a escolha pelo aproveitamento dos conhecimentos e recursos locais orientados à produção da vida das famílias agricultoras... (Fernandez, 2019, p. 398).