Artigo original • Revisão por pares • Acesso aberto
O vírus da fome: os impactos da pandemia da Covid-19 na insegurança alimentar latino-americana
The hunger virus: the impacts of the Covid-19 pandemic on latin american food insecurity
Marcelly Thaís Marques Ribeiro, Thiago Lima da Silva
Resumo A América Latina é uma região historicamente fragilizada, marcada pelas consequências do colonialismo extrativista, da economia dependente voltada à exportação de commodities e pelo trabalho informal. Nesse cenário, quais são os efeitos da pandemia da Covid-19, considerando a recessão econômica global, o aumento do preço dos alimentos e a interrupção das cadeias globais de abastecimento e produção na latino-americana região? Além do aumento da pobreza, do desemprego e da necessidade de assistência social: o aumento da fome. Este trabalho buscou mapear as conexões entre a pandemia e a fome, analisando se existem elementos internacionais que interferem nessas conexões. Por meio de informações de Organizações Internacionais, tais como a Organização das Nações Unidas e a Comissão Econômica para América Latina e Caribe, e de notícias e informes governamentais, os dados foram analisados sob a Teoria dos Regimes Alimentares de Friedman e a Teoria Neoextrativista de Gudynas. Palavras-chave: Pandemia. Insegurança alimentar. Covid-19. América Latina. Neoextrativismo. Regime Alimentar. Abstract Latin America is a historically fragile region, marked by the consequences of extractive colonialism, as a dependent economy focused on commodity exports and unregulated labor. In this scenario, what are the consequences of the Covid-19 pandemic, considering a global economic recession, rising food prices, and disruption of global supply and production chains in Latin America? In addition to the increase in poverty, unemployment, and the need for social assistance, it's the elevation of hunger. This work seeks to map the connections between the pandemic and hunger, analyzing whether there are international elements that interfere with these connections. Through the data from International Organizations, such as the United Nations and the Economic Commission for Latin America and the Caribbean. Additionaly from government news and reports, the data were analyzed under Friedman's Food Regime Theory and Gudynas' Neo-Extractivist Theory. Keywords: Pandemic. Food Insecurity. Covid-19. Latin America. Neoextractivism. Food Regimes. | Submissão: Aceite: Publicação: |
Citação sugerida RIBEIRO, Marcelly Thaís Marques; SILVA, Thiago Lima da. O vírus da fome: os impactos da pandemia da Covid-19 na insegurança alimentar latino-americana. Revista IDeAS, Rio de Janeiro, v. 19, p. 1-27, e025002, jan./dez. 2025. Licença: Creative Commons - Atribuição/Attribution 4.0 International (CC BY 4.0). |
Introdução
A produção agroalimentar tem papel fundamental na construção social e econômica da América Latina, sendo os países latinos tradicionais exportadores de produtos agrícolas e agroindustriais (Maluf, 2009). Então, com a região latino-americana, em 2021, comportava 80,1 milhões de pessoas em Insegurança Alimentar Severa e 239,7 milhões em Insegurança Alimentar Moderada ou Severa? (FAO et al., 2022). Em um primeiro olhar a relação não é clara, e parece impensável que uma região produtora e exportadora de alimentos possua uma parcela considerável da população em situação de Insegurança Alimentar e sofrendo com a fome. O que torna essa situação possível? Os números encontrados são fruto unicamente da pandemia? Existem fatores internacionais que influenciam essa situação?
A resposta não é simples, se consideradas apenas as principais relações entre a pandemia e a fome, tem-se: alto índice de desemprego e informalidade, diminuição da renda, interferência nos fluxos de produção e distribuição de alimentos, aumento do preço da comida, inflação, interferência em programas de combate à fome preexistentes e impacto na produção e alimentação dos agricultores familiares. Contudo, apesar das causas do aumento da Insegurança Alimentar em 2020 e do crescente aumento da fome em 2021 e 2022, a região latino-americana já era assolada pelo mal da fome, pela Insegurança Alimentar e pela desigualdade social. As vulnerabilidades que existiam antes foram apenas ampliadas pela pandemia.
Nesse sentido, a alimentação é uma forma de distinção social histórica. “Dize-me o que comes e te direi quem és” (Brillat-Savarin, 2019, p. 21). A frase, originalmente em francês e datada de 1825, estava associada, primordialmente, ao caráter comportamental e psicológico da alimentação. Contudo, quando observada sob a ótica de uma conjuntura histórica, pode ser aplicada a uma análise social. Os indivíduos são separados por seus hábitos alimentares e por quanto dispõem – seja força de trabalho, ou dinheiro – para a própria alimentação (Montanari, 2004). Nessa lógica, Amartya Sen (2000) descreve duas maneiras de acesso à alimentação: por meio da produção, como fazem os camponeses, e adquirindo nos centros urbanos. Justamente por isso, a fome e seus fenômenos não estão associados unicamente à produção de alimentos, mas à economia local e internacional, às políticas sociais e, sobretudo, à renda. E atrelados, também, à frequência, ao grau nutricional, quantitativo e qualitativo das dietas alimentares. Os produtos processados e ultraprocessados tendem a custar menos e estão sujeitos ao baixo valor nutricional. Por terem um preço inferior, são consumidos com mais frequência pela população em situação de vulnerabilidade econômica e social, vítima da Insegurança Alimentar (IA).
Estabelecida essa relação, em março de 2020, o mundo foi bombardeado pela declaração da pandemia da Covid-19 que, além dos impactos na saúde e na economia, atingiu a dieta da população global. Seja pela ausência do grau de nutrientes necessários – a fome oculta – ou pela privação de acesso aos alimentos, os indivíduos afetados enfrentaram a vulnerabilidade social e, com ela, a Insegurança Alimentar (IA).
De acordo com a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO):
A segurança alimentar existe quando todas as pessoas, em todos os momentos, têm condições físicas, sociais e econômicas ao acesso de alimentos suficientes, seguros e nutritivos, que atendam às suas necessidades e preferências alimentares para uma vida ativa e saudável (2003).
Durante a pandemia, esse acesso foi comprometido em todo o globo em decorrência do declínio da renda, sobretudo dos trabalhadores informais, do aumento do preço dos alimentos e da interrupção nas cadeias globais de produção e distribuição (Clapp; Moseley, 2020). Os primeiros casos de Covid-19 registrados na América Latina são de março de 2020. Diferente da Europa e Ásia, o continente latino-americano teve uma janela maior para promoção de políticas públicas de combate à pandemia. Apesar dos esforços, porém, por causa das negligências propositais, como no caso do Brasil, um ano depois, em março de 2021, a região representou 27% das mortes globais pelo vírus, apesar de ter 6% da população mundial (Brasil de Fato, 2021). Em 2022, a propagação do vírus foi controlada e mais de dois terços da população da América Latina e do Caribe já tinham recebido duas doses da vacina contra a Covid-19 (Opas, 2022). Apesar disso, faltando cinco meses para os três anos de anúncio da pandemia, o total de mortes por Covid-19 na região latino-americana correspondia a mais de um milhão de mortos, e o total de mortes em todo o mundo chegou a 6,6 milhões (Opas, 2022a).
São cinco os canais externos de impactos econômicos da pandemia na região latino-americana: a diminuição da atividade econômica dos principais parceiros de negócios; a queda nos preços dos produtos primários; a ruptura das cadeias de valor globais; a menor demanda por serviços turísticos; e a intensificação da aversão ao risco e melhores condições financeiras em todo o mundo (Cepal et al., 2020). Assim, este artigo conta com outras seis seções que buscaram contextualizar e mapear as conexões entre a pandemia e a fome, considerando os fatores que reduziram, principalmente, o acesso aos alimentos, e compreender como existe fome em uma região historicamente produtora de alimentos. A segunda seção consiste na metodologia e na explicação do processo e recorte da pesquisa; a terceira apresenta os dados da Insegurança Alimentar e da fome no mundo e na América Latina; a quarta é uma revisão teórica sobre o regime alimentar corporativista e suas repercussões na segurança alimentar mundial; e a quinta seção dialoga com a quarta, trazendo a análise para o eixo latino-americano por meio de uma reflexão da posição da América Latina na divisão internacional do trabalho e da teoria neoextrativista. Por fim, nas considerações finais, foram avaliados os dados e as teorias apresentados, visando compreender o papel dependente da região herdado da colonização extrativista e a influência desse caráter na fome.
Metodologia
Este trabalho é uma pesquisa documental sobre as conexões entre a fome e a pandemia da Covid-19. Inicialmente, foi realizado um levantamento de notícias sobre a pandemia e a fome utilizando as palavras-chave: fome, pandemia, América Latina e seus correspondentes em espanhol, hambre, pandemia e América Latina, e em inglês, hungry, pandemic e Latin America. Além disso, foram analisados os dados presentes nos relatórios da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal), da Organização Internacional do Trabalho (OIT), do Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola (Ifad), do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), do Programa Mundial de Alimentos (PMA) e da Organização Mundial da Saúde (OMS).
Os principais documentos utilizados foram o The State of Food Security and Nutrition in the World 2022, O Panorama Social da América Latina 2020 e o Panorama Social da América Latina 2021. Foi realizada, ainda, uma breve Revisão Sistemática de Literatura (RSL) sobre Regimes Alimentares e o neoextrativismo na América Latina para responder à pergunta: “para além da pandemia, o que leva uma região historicamente produtora de alimentos a sofrer com a fome?”. As principais literaturas consultadas foram os livros Pós-extrativismo e decrescimento, de Alberto Acosta e Ulrich Brand, As fronteiras do neoextrativismo na América Latina, de Maristella Svampa, Extractivismos. Ecología, y economía política de un modo de entender el desarrollo y la naturaleza, de Eduardo Gudynas, e Regimes Alimentares e Questões Agrárias, de Philip McMichael.
Covid-19: o vírus da fome
O sistema agroalimentar, a fome e a pandemia estão intrinsecamente interligados. Utilizando o conceito de Davis e Goldberg (1957), o sistema agroalimentar é o conjunto de operações de disponibilização de insumos agrícolas, incluindo os processos de produção, armazenamento, transformação e distribuição dos alimentos. Esse sistema faz com que a comida deixe de ser uma necessidade básica, tornando-se uma mercadoria, uma commodity. O mercado de commodities tem se tornado cada vez mais conectado com o mercado financeiro. Embora isso aumente o investimento na agricultura em todo o mundo e possibilite o investimento em terras estrangeiras, também favorece que decisões tomadas por investidores, sobretudo de países desenvolvidos, interfiram no acesso das pessoas à alimentação. Em países subdesenvolvidos, indivíduos pobres gastam de 50 a 80% de sua renda com alimentação (Clapp, 2020). Quando os preços sobem ou a renda diminui, como na pandemia, o acesso aos alimentos por essa população é imediatamente comprometido. Ademais, esses países subdesenvolvidos têm frequentemente um regime de acumulação de capital associado à espoliação e à extração de recursos naturais (Acosta, 2016). Dessa forma, algumas das principais mazelas do sistema agroalimentar vigente, além da fome em si, são a dependência do comércio internacional para garantia da segurança alimentar, a expansão da fronteira agrícola, sobretudo, na produção agropecuária e a má distribuição da produção de alimentos saudáveis. Esses fatores combinados são nocivos a toda população, não apenas aquela que está em situação de Insegurança Alimentar.
A expansão da fronteira agrícola, a degradação ambiental e a produção em massa podem estimular o processo de modificações genéticas; as espécies tornam-se suscetíveis a novos patógenos anteriormente inofensivos que, em um ciclo natural, poderiam ser evitados, ou ter contenção facilitada. Nesse caso, a interação desses animais contaminados com a espécie humana pode ocasionar consequências desastrosas no âmbito social, de saúde pública e econômico (Zanella, 2016), a exemplo do que ocorreu com a gripe aviária, a crise da vaca louca e a pandemia da Covid-19. Um relatório da Organização Mundial da Saúde (OMS) destaca duas principais possibilidades para o surgimento do Sars-Cov-2: pela transmissão do morcego para um mamífero intermediário e, dele para o ser humano, ou do morcego para o ser humano. Considerando a classificação das doenças transmissíveis e não transmissíveis, a Covid-19 é uma doença transmissível que advém do mundo natural e faz parte das que estão vinculadas aos hábitos alimentares humanos e ao estilo de vida. No caso do interior da China, tanto a dificuldade na realização de uma agricultura diversificada quanto o acesso escasso a alimentos saudáveis resultaram na resposta alimentar histórico-cultural de uma população em necessidade (Fonseca, 2020).
Nesse sentido, além das complicações relacionadas à saúde, a pandemia da Covid-19 é um evento cataclísmico que afetou todo sistema global, incluindo o sistema agroalimentar. O isolamento social imprescindível dificultou o acesso da população a alimentos saudáveis e nutritivos, e também impactou na renda e nas cadeias de produção e distribuição, o que resultou na subnutrição e na fome (Clapp; Moseley, 2020). Desde 2020, os números da fome, da subalimentação e da Insegurança Alimentar têm aumentado, causando as desigualdades entre os países e a sua discrepante recuperação econômica. A prevalência da subalimentação, por exemplo, estava praticamente estagnada desde 2015, contudo, aumentou de 8% para 9,8% entre 2019 e 2021. Ademais, cerca de 828 milhões de pessoas foram afetadas em algum grau pela fome em 2021, um aumento de aproximadamente 150 milhões desde o início da pandemia. Esse estudo está presente no The State of Food Security and Nutrition in the World 2022 (Sofi 2022).
O relatório Sofi 2022 foi elaborado por uma equipe composta pela Divisão de Economia Agroalimentar (ESA) da FAO, em colaboração com a Divisão de Estatística da Comissão Econômica para América Latina e o Caribe (Cepal), uma equipe de técnicos da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), do Fundo Internacional para o Desenvolvimento Agrícola (Fida), do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), do Programa Mundial de Alimentos (PMA) e a Organização Mundial da Saúde (OMS). A pesquisa do Sofi 2022 foi realizada com base na nova metodologia da FAO lançada em 2020. Os dados foram atualizados em todos os países monitorados. Isso incluiu uma revisão da série de 2010 até 2019 para todos países, e até 2020 para os 63 países com o maior número de pessoas subnutridas. Para esses 63 países as estimativas para 2020 foram substancialmente revisadas em relação à avaliação do ano anterior, considerando dados oficiais sobre produção e comércio relatados por esses países. Para os demais países, os valores da oferta alimentar de 2020 usados para estimar a prevalência de subalimentação ainda são previsões. A pandemia dificultou as atualizações domésticas dos dados de consumo de alimentos para todos os países (FAO et al., 2022).
Vale ressaltar que as análises de prevalência de Insegurança Alimentar Grave ou Moderada são feitas com base na The Food Insecurity Experience Scale (Fies).[1] Os números são informados mediante dados de pesquisa coletados anualmente pela FAO, os quais, em 2020, foram reunidos, principalmente, por meio de entrevistas por telefone em virtude das restrições impostas pela pandemia. Já em 2021 as entrevistas presenciais foram realizadas na maioria dos países, o que tornou o balanço para 2021 um pouco mais confiável que o do ano anterior (FAO et al., 2022). Por esse motivo, esta pesquisa se baseou nos dados do Sofi 2022.
Antes de analisar os dados, é importante fazer uma distinção teórica, seguindo os conceitos da FAO, se a fome é “uma sensação desconfortável e dolorosa causada pela insuficiência da energia adquirida pela alimentação” (FAO et al., p. 204). É a privação de alimentos e não ingestão de calorias suficientes. Neste artigo foi utilizado de forma intercambiável com subalimentação (crônica) e medido pela prevalência de subalimentação (Prevalence of Undernourishment – PoU), como empregado pela FAO.
Além do conceito de fome é importante diferenciar a Insegurança Alimentar Moderada e a Insegurança Alimentar Severa. A primeira, de acordo com a FAO, é definida pela incerteza na capacidade de obter alimentos e a redução na qualidade e/ou quantidade dos alimentos consumidos por falta de dinheiro ou de outros recursos. É a falta de constância ao acesso aos alimentos, o que diminui a qualidade da dieta, e pode ter consequências negativas para a nutrição, saúde e bem-estar. Já a segunda acontece quando as pessoas ficam sem comida, sofrem com a fome e, em alguns casos, podem passar dias sem comer, o que coloca a saúde e o bem-estar em risco. Ambos os níveis são medidos pela Fies (FAO et al., 2022).
Em 2020, todas as regiões sofreram com o aumento drástico nos níveis de Insegurança Alimentar (FAO et al., 2022). No Gráfico 1, publicado pela FAO (2022), é possível acompanhar o aumento gradual da Insegurança Alimentar global desde 2014 e o pico do aumento sem precedentes entre 2019 e 2020. Aproximadamente uma em cada três pessoas no mundo (2,37 bilhões) não tiveram acesso à alimentação adequada durante o primeiro ano de pandemia, o que significou um aumento de quase 320 milhões de pessoas (FAO; Ifad; Unicef; PMA; OMS, 2021). É importante ressaltar que, como os dados demonstram, a pandemia contribuiu para a dificuldade das pessoas ao acesso a alimentos, contudo, é difícil mensurar até que ponto os impactos são fruto da pandemia e até que ponto são causados pelas vulnerabilidades preexistentes. No caso da América Latina e do Caribe, é possível observar a maior variação de todas as regiões entre os dados de Insegurança Alimentar entre os anos de 2019 e 2020 (Gráfico 1). Além da Insegurança Alimentar, outro índice utilizado pela FAO para analisar a vulnerabilidade é o índice de prevalência de Insegurança Alimentar Severa (Tabela 1). O State of Food Insecurity and Nutrition in the World 2022 computou que, no ano de 2020, tal prevalência na América Latina atingiu 11,1% da população, o índice subiu 2,9% em apenas um ano. Apesar da oscilação dos últimos cinco anos, a escala nunca tinha aumentado mais de 1,4%. Para o ano de 2021, o dado trazido pelo Sofi 2022 é de que o índice aumentou para 13%. Com relação aos dados de Insegurança Alimentar por números de pessoas, tem-se que: em 2021, 80,1 milhões de pessoas enfrentam a Insegurança Alimentar Severa na América Latina e 93,5 milhões na América Latina e no Caribe.
O relatório também apresenta a Prevalência da Insegurança Alimentar Moderada ou Severa (Tabela 1), a América Latina e o Caribe registraram, juntos, em 2020, 39,5%, ou seja, um aumento de 7,8% comparado ao ano anterior, já entre 2018 e 2019 o aumento foi de apenas 0,3%. Em número de pessoas, o total em 2020 representava 258,4 milhões e, em 2021, 239,7 milhões de pessoas enfrentaram a Insegurança Alimentar Moderada ou Severa na América Latina (FAO et al. 2022). Nos últimos seis anos, o índice de Insegurança Alimentar tem aumentado gradativamente, afetando 30% da população mundial. Já na América Latina e no Caribe, desde 2014, o nível de Insegurança Alimentar tem crescido, partindo de 24,6% para 40,6% em 2021 (Gráfico 1).
Apesar da escalada significativa entre 2014 e 2019 demonstrada no Gráfico 1, entre 2019 e 2020 o impacto da Covid-19 na IA latina foi imediato e preocupante, pois a porcentagem de pessoas em IA Moderada subiu 4,9%, enquanto a de pessoas em IA Severa subiu 2,9%. Considerando que o aumento máximo nos cinco anos anteriores para as duas escalas foi de 6,4% (2014 para 2016) e que o aumento apenas em 2020 foi de 9%, os impactos da pandemia no nível de Insegurança Alimentar são enormes. Além do vírus, esse momento trouxe a fome. Justamente por isso alguns a Covid-19 é considerado o vírus da fome. Em dados gerais, em 2021, a Insegurança Alimentar Severa ou Moderada afetou 268 milhões de pessoas na América Latina – a região possui 660 milhões de habitantes.
Tabela 1 – Prevalência da Insegurança Alimentar Severa e da Insegurança Alimentar Severa ou Moderada entre os anos de 2014 e 2021
| Prevalência da Insegurança Alimentar Severa % | Prevalência da Insegurança Alimentar Severa ou Moderada % | |||||||||||
| 2014 | 2016 | 2018 | 2019 | 2020 | 2021 | 2014 | 2016 | 2018 | 2019 | 2020 | 2021 | |
Mundo | 7.7 | 7.9 | 9.0 | 9.3 | 10.9 | 11.7 | 21.2 | 22.7 | 25.0 | 25.5 | 29.5 | 29.3 | |
América Latina e Caribe | 7.5 | 8.8 | 9.4 | 9.9 | 12.8 | 14.2 | 24.6 | 31.0 | 31.4 | 31.7 | 39.5 | 40.6 | |
América Latina | 5.7 | 7.1 | 7.5 | 8.2 | 11.1 | 13.0 | 21.8 | 28.7 | 29.1 | 29.4 | 37.5 | 38.9 |
Fonte: FAO et al., 2022, p. 25.
Gráfico 1 – Insegurança Alimentar Severa ou Moderada escalonando entre os anos de 2014 e 2021
Fonte: FAO et al., 2022, p. 49 (tradução do autor).
A Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) define uma dieta saudável como uma alimentação baseada na grande variedade de produtos in natura ou alimentos minimamente processados. A dieta deve ser equilibrada entre todos os grupos de alimentos, incluindo grãos, legumes, variedade de frutas e vegetais, água potável e quantidades moderada de proteínas (laticínios, ovos, peixes e carnes). Uma dieta saudável é aquela que atende às necessidades de uma vida ativa ao longo do ciclo de vida. Durante a pandemia, o acesso a uma dieta saudável foi comprometido em todo o mundo. Em 2020, 42% da população não conseguia arcar com o custo de 3,54 dólares por dia por pessoa, preço de uma dieta saudável. Se comparado ao ano anterior, esse preço sofreu um aumento de 3,3%.
Em quase todos os países da América Latina, logo no início da pandemia, o índice de preços de alimentos subiu mais do que o índice de preços ao consumidor (Gráfico 2). Isso se deu, principalmente, pela incerteza no fornecimento (Cepal; NU et al., 2020). Os agricultores de base familiar sofreram com a dificuldade de produção e de escoamento dos alimentos, em especial com o fechamento de feiras, centros de venda e restrições. Entre janeiro e maio de 2020 o aumento do preço dos alimentos foi de 4,6%, valor aproximadamente quatro vezes superior à elevação do Índice Geral de Preços (1,2%).
Gráfico 2 – América Latina (média regional e 11 países selecionados): evolução do Índice de Preços ao Consumidor (CPI) e preço de alimentos, dezembro de 2019 a maio de 2020
Fonte: Cepal, 2020, p. 12.
Além disso, a inflação aumentou em todos os países latinos, a depreciação das moedas locais é repassada aos preços dos alimentos, os impactos do câmbio sobre os preços das dietas alimentares não são homogêneos entre os países e os produtos, variando em função da produção local, das políticas de regulamentação dos preços, das taxas de câmbio e da demanda (Cepal, NU et al., 2020).
O aumento no preço dos alimentos seguiu durante todo ano de 2020, dificultando o acesso a alimentos saudáveis, nutritivos e em quantidade suficiente para manter a segurança alimentar. De acordo com a Cepal e a OIT (2020), o salário mínimo real sofreu ligeira melhora em relação ao observado em 2019. Contudo, não foi o bastante para amenizar os níveis de pobreza e a Insegurança Alimentar latina. O aumento entre 2019 e 2020 foi ínfimo, se comparado aos números dos aumentos observados entre 2010 e 2018. Em geral, a situação do salário mínimo da região apenas demonstraram a dificuldade na aplicação de medidas salariais compensatórias, que acabaram repercutindo no nível de Insegurança Alimentar. De acordo com a FAO, em 2020, o valor de uma dieta saudável na América Latina (Tabela 2), para uma pessoa era de 3,56 dólares e mais de 117 milhões de latinos não conseguiam custeá-lo.
Tabela 2 – Custo de uma dieta saudável na América Latina em 2020
Custo de uma dieta saudável em 2020 | Pessoas que não conseguiam custear uma dieta saudável em 2020 | |||
Custo pessoa/dia (em dólar) | Variação entre 2019 e 2020 (por cento) | Porcentagem | Número total (em milhões) | Variação entre 2019 e 2020 (por cento) |
3,56 | 2,5 | 21 | 117,3 | 6,9 |
Fonte: FAO et al., 2022, p. 77. [2]
Gráfico 3 – Variação do preço de uma dieta saudável na América Latina
Fonte: FAO et al., 2022, p. 78.
Josué de Castro (1961) define a fome oculta como fruto da fabricação humana, sendo uma de suas causas a monotonia alimentar. A baixa variedade na dieta tende a diminuir o grau nutricional, e o grau de refinamento e processamento dos alimentos também é responsável pela perda de nutrientes. Durante a pandemia, com os choques econômicos e a consequente redução de renda, a variedade, a qualidade e o valor nutricional das dietas latinas foram reduzidos. Um dos grupos mais afetados por uma mudança repentina do hábito alimentar são as crianças, sobretudo as meninas. Se os valores de proteínas, vitaminas, carboidratos e nutrientes não forem fornecidos de maneira estável, principalmente durante a primeira infância, as consequências serão perceptivas ao longo de toda a vida, e em alguns casos de maior gravidade, nas gerações futuras. Os impactos do período pandêmico serão observados nas futuras pesquisas de crianças latinas e caribenhas com desenvolvimento retardado em decorrência a subalimentação.
Renda e pobreza na América Latina
A fome, a desnutrição e, portanto, a Insegurança Alimentar estão conectadas com a pobreza e as desigualdades sociais. O próprio sistema agroalimentar é moldado pelos interesses do capital, pela modernidade e eficiência de mercado. Dessa forma, na economia de mercado a alimentação está sujeita a oferta e demanda, assim como sua variação de preços. Sendo a fome um problema social, sem resoluções individuais, se um indivíduo tem como única fonte de renda seu trabalho, a sua alimentação depende desta (Paula, 2020). A privação de renda é uma das razões primordiais da diminuição da capacidade de um indivíduo (e de sua família), e essa capacidade inclui desde a renda (que não é a único instrumento capaz de gerar capacidade) até questões sociais (Sen, 2000). Neste trabalho, tratamos apenas da renda e da pobreza como limitantes da capacidade.
Dessa forma, para analisar as conexões entre a pandemia e a fome, é necessário mencionar que uma das principais causas da Insegurança Alimentar na população vulnerável durante a pandemia foi a perda de renda. Nesse sentido, de acordo com a Comissão Econômica para a América Latina e Caribe (Cepal, 2021) a pobreza e a pobreza extrema alcançaram níveis superiores aos observados nos últimos 12 e 20 anos respectivamente. Segundo a estimativa da Cepal, no ano de 2020 a taxa da pobreza extrema foi de aproximadamente 12,5 %, já a taxa de pobreza alcançou 33,7%. Em 2021, houve uma breve redução na pobreza (32,1%) e aumento da pobreza extrema (13,8%) (Cepal, 2022).
O total de assolados pela pobreza na região latino-americana alcançou 204 milhões em 2020 e 201 milhões em 2021 (Gráfico 4). Este número seria maior não fossem os programas de distribuição de renda emergencial instituídos pelos Estados (Cepal, 2022).
Gráfico 4 – América Latina (18 países):[3] pessoas em situação de pobreza e pobreza extrema, 1990-2021[4] (em milhões de pessoas)
Fonte: Cepal, 2022, p. 9
Os países que apresentaram o maior aumento da pobreza em 2020 foram Brasil, Argentina e México (El País, 2020). As principais causas da elevação da pobreza na região latino-americana foram o trabalho informal e a interrupção dos trabalhos em virtude da pandemia. A previsão da Organização Internacional do Trabalho (OIT) era de que o crescimento do desemprego na região fosse de 10%. Em paralelo, o Banco Mundial estimava uma perda de ao menos 25 milhões de empregos em meados de julho de 2020. Além da interrupção de serviços, muitos latino-americanos sofreram as consequências do trabalho remoto, diminuição de funções e redução salarial. O grau de fragilidade da população no mercado de trabalho variaram de país para país, considerando as diferentes maneiras de combater a pandemia, as médias sanitárias e a eficácia dos auxílios emergenciais. Ademais, a crise do desemprego atingiu os trabalhadores informais, refugiados e mulheres de maneira desproporcional (Cepal, 2021).
O Peru, por exemplo, durante a pandemia, passava por uma crise econômica com uma queda de 40% no Produto Interno Bruto (PIB). Além disso, 70% da população estava relacionada ao trabalho informal, o que dificultou a realização de quarentena e ampliou os índices de instabilidade monetária e de Insegurança Alimentar, ademais, 21% apenas da população pobre dispõe de eletrodomésticos básicos, como geladeira. Já na Costa Rica, o índice de desocupação foi de 15,4%, sendo a maior taxa de participação no mercado de trabalho das mulheres (Cepal, 2021). No Brasil, o índice de desempregados nos núcleos familiares (perda do emprego de ao menos um membro da família) foi de 40,1% nos lares com Insegurança Alimentar Leve, 28,4 % nos lares sem Insegurança Alimentar, 17,9% naqueles com Insegurança Alimentar Moderada e 13,4% nos lares com Insegurança Alimentar Grave[5] (Rede Penssan, 2021).
De acordo com a Cepal e a OIT (2020), a taxa de desemprego da América Latina estava aumentando gradativamente em razão da crise econômica entre 2014 e 2019. Diferente das crises anteriores, ao longo da pandemia o mercado informal não foi capaz de absorver os desempregados. A pandemia afetou, ainda, de maneira significativa a participação das mulheres no mercado de trabalho. Esta informação por si já é impactante e, quando adicionada ao dado de que mulheres sofrem em maior grau com a Insegurança Alimentar, a situação torna-se alarmante. Conforme a Cepal (2020), os empregos diminuíram 5,0% entre os homens e 8,1% entre as mulheres. Em 2021, a redução foi de 11,8%, uma diferença de 3,7 pontos percentuais superior à taxa de desemprego masculina, 8,1% (Cepal, 2022). Ainda segundo a Cepal, as estudantes mulheres também são as mais afetadas pela interrupção da alimentação escolar. Essa política tem um papel fundamental no combate à Insegurança Alimentar entre crianças e jovens, pois em muitos casos a refeição oferecida na escola é a única que a população em estado de vulnerabilidade social tem acesso. Dos 33 países da região da América Latina e Caribe, 21 tentaram dar continuidade à merenda escolar de alguma maneira no decorrer da pandemia. Com o retorno das aulas presenciais após a vacinação, a situação da merenda escolar tem se normalizado, mas a questão agora é o aumento da evasão escolar no “pós-pandemia”.
A América Latina possui um déficit nas políticas de assistência social,
(...) cujo fim é garantir uma renda adequada, promover o acesso aos serviços sociais e fomentar o trabalho decente para toda a população, constitui um direito reconhecido em numerosos instrumentos legais nacionais e internacionais e é essencial para erradicar a pobreza e reduzir significativamente as desigualdades (Cepal, 2021, p. 23).
Nas últimas duas décadas, os governos da América Latina têm buscado maneiras de ampliar essa assistência. Contudo, ainda existem muitas falhas no sistema de proteção social da região. Em 2019, um ano antes da pandemia, apenas cerca de 18,5% da população latino-americana era beneficiária de programas de transferências condicionadas. Já no ano de 2020 32 países adotaram 263 medidas não contributivas de proteção social, incluindo a entrega de alimentos. As transferências monetárias e em espécie chegariam, em média, a 49,4% da população dos países da região e tinham um valor de cerca de 1,25% do PIB latino-americano. No Gráfico 5 é possível observar a distribuição dos auxílios emergenciais entre a população. Apesar de significativo, esse investimento não foi suficiente para conter os impactos da Covid-19 e da pobreza na região.
Gráfico 5 – América Latina e Caribe (28 países): pessoas em domicílios que recebem transferências emergenciais monetárias e em espécie (2020) e dos Programas de Transferências Condicionadas (PTC)[6]
Fonte: Cepal, 2021, p. 24.
Regime alimentar corporativo e a Covid-19
A ideia de regime alimentar é resultado de um período de políticas nacionais de regulamentação em declínio e do avanço da globalização. O conceito, portanto, localiza na geopolítica a ascensão e enfraquecimento da agricultura doméstica dentro do sistema capitalista, especificando as relações entre a ordem mundial e o comércio agroalimentar (McMichael, 2016). A ideia de regime alimentar foi formulada, inicialmente, por Harriet Friedmann (1987), a partir de uma pesquisa realizada sobre a ordem alimentar no pós-Segunda Guerra Mundial, posteriormente publicada num artigo seminal em conjunto com Philip McMichael (1989), em que ambos caracterizam o regime como um conjunto de regras formais e informais dentro uma de determinada conjuntura histórica mundial que introduz um ordenamento global das relações internacionais de produção, comércio, circulação e consumo de alimentos. De acordo com McMichael (2016), “a análise de regime alimentar não diz respeito somente às relações agrícolas internacionais de produção e consumo, mas também ao papel da agricultura comercial no processo de construção do Estado na era moderna”. Dessa forma, os autores defendem a ideia de três regimes alimentares: o primeiro, centrado na Grã-Bretanha (1870-1930), o segundo, nos Estados Unidos (1950-1970), e o terceiro, o regime vigente: o regime corporativo (McMichael, 2016). O terceiro regime foi consolidado nos anos 1990 juntamente com o neoliberalismo, baseado na liberalização agrícola, no modelo agroexportador, em grandes corporações agrícolas e na dependência, sobretudo, dos países do sul global, ao comércio internacional de alimentos. O desmantelamento da agricultura doméstica e de políticas públicas de incentivo agrícola, em conjunto com mudanças estruturais e de regras da Organização Mundial de Comércio são a marca do regime alimentar corporativista (Dias; Amorim; Barbosa; Lima, 2022).
Nesse sentido, um dos fatores que levaram ao aumento do preço dos alimentos durante a pandemia foi a interrupção da cadeia de exportação de alimentos. Graças à interdependência entre as nações, as políticas internas não são as únicas responsáveis pela garantia do abastecimento alimentar mundial (Dias; Amorim; Barbosa; Lima, 2022). É importante ressaltar que, enquanto os países do norte global possuem recursos financeiros e logísticos para adquirir alimentos de mercados que permaneceram em funcionamento, países em desenvolvimento não possuem esses recursos, sendo mais sujeitos a vulnerabilidade alimentar (Lima, 2012; Dias, 2018 apud Dias; Amorim; Barbosa; Lima, 2022). Esses países são afetados por dificuldades relacionadas à alta de preços internos, principalmente quando considerado a alta do valor do dólar em comparação às moedas locais, como disposto na na seção anterior.
De acordo com Clapp e Moseley (2020), os últimos 70 anos estimularam a ascensão de um sistema agroalimentar global baseado na produção industrial, na especialização e no comércio internacional. As cadeias globais de abastecimento de alimentos são dominadas por grandes empresas privadas. A ideia era alavancar as economias e ampliar o acesso aos alimentos por meio da produção em larga escala e da manutenção de preços baixos. Contudo, a manutenção dessa balança não se demonstra eficaz, dadas as últimas crises alimentares. A produção em larga escala para o comércio internacional criou vulnerabilidades ao priorizar a especialização e o comércio em detrimento da diversidade do sistema agroalimentar. Isso posto, para compreender melhor o choque da pandemia, é preciso retomar à revolução verde. A crise alimentar de 1972 a 1974 explodiu no auge do impulso global para adoção de métodos industriais e da tecnificação na produção do campo. A crise da década de 1970 foi impulsionada pelo sentimento de incerteza da capacidade do abastecimento do mercado global, fazendo com que o preço dos principais grãos aumentassem consideravelmente. Os países em desenvolvimento, a exemplo dos países latino-americanos, passaram gradualmente a depender da importação de alimentos após a Segunda Guerra Mundial. Essa dependência é resultado das práticas do segundo regime alimentar, em decorrência da ajuda alimentar excessiva por meio do “derramamento de alimentos” com a disponibilização de grãos com baixo ou nenhum custo. Tal prática foi adotada principalmente pelo governo dos Estados Unidos na intenção de transformar as economias periféricas em um mercado consumidor de insumos agrícolas (Clapp; Moseley, 2020). Além de produtos agrícolas, o governo norte-americano investiu em fertilizantes e outros insumos que condicionaram a agropecuária desses países às novas práticas de produção (McMichael, 2016).
Quando a crise alimentar explodiu em 1970, essa ajuda já havia sido reduzida desde a década de 1960. Essas políticas produtivas de meados até o final da década de 1970 foram as responsáveis diretas pelas crises do sistema alimentar ao longo dos anos de 1980 e 1990. Com a crise no final da década de 1970, os países do sul global ficaram endividados por causa das taxas das dívidas internacionais que adquiriram por meio de empréstimos nas décadas anteriores. As práticas neoliberais foram responsáveis por aumentar a taxa de juros na tentativa de conter o crescimento global da inflação. Para além disso, houve pressões do Fundo Monetário Internacional e do Banco Mundial para a realização de mudanças estruturais neoliberais em troca do apoio financeiro para recuperar a balança de pagamentos (Clapp; Moseley, 2020).
Clapp e Moseley (2020) apontam que no setor agrícola essas políticas de ajuste incluíram a abertura dos mercados ao comércio internacional, o corte dos subsídios agrícolas do governo e a desvalorização das moedas, pois a ideia era garantir que a produção agrícola ocupasse um local de destaque na recuperação econômica. Contudo, com a eliminação dos subsídios aos produtores locais de alimentos e a redução de tarifa sobre exportação, os países produtores observaram o declínio da produção local e o aumento das importações de alimentos. O propósito desse modelo era que a segurança alimentar fosse garantida a partir da manutenção de baixos preços globais de alimentos e do funcionamento do comércio internacional. A manutenção desse padrão fez com que na crise seguinte, de 2007 a 2008, o papel do setor privado nas cadeias globais de abastecimento agrícola estivesse consolidado e, embora os preços tenham sido relativamente baixos e estáveis durante as décadas anteriores, em 2008 os preços globais dos alimentos aumentaram em média 50 a 100%, para alguns insumos básicos, como o arroz. Apesar dos vários gatilhos para o aumento dos preços durante essa crise, é importante ressaltar que os preços subiram em meio à incerteza da oferta, de mudanças climáticas e do crescimento populacional. Isso acarretou uma pressão política para solucionar a situação com mais investimento no setor privado, gerando uma ampliação na apropriação de terras e na especulação de capital de risco na produção agrícola.
Essas tendências criaram vulnerabilidades no setor ao consolidar o poder ao agronegócio das transnacionais, consagrando o modelo da cadeia de abastecimento agroalimentar global com base na produção e comércio de commodities e enfraquecendo os direitos humanos, os direitos da terra e os direitos dos produtores de alimentos mais vulneráveis. Após observarmos como foi nociva a dependência no mercado internacional para garantia da segurança alimentar e nutricional no decorrer das crises expostas, analisamos a crise alimentar da Covid-19. O aumento que o preço dos alimentos sofreu ao longo da pandemia não caracterizou majoração nos mercados mundiais. A pandemia afetou os sistemas alimentares por meio de várias dinâmicas interligadas: as interrupções da circulação de alimentos das cadeias de abastecimento em virtude dos bloqueios sancionados pela doença; a recessão global e o consequente aumento do desemprego que levou ao aumento da fome; os fatores combinados criando uma dinâmica desigual de preço de alimentos em escala local e global exacerbando as vulnerabilidades preexistentes e aumentando a fome (Clapp; Moseley, 2020).
Dessa forma, a crise no sistema agroalimentar causada pela Covid-19 é altamente complexa, e o abalo na segurança alimentar e nutricional global comprova as diversas falhas do regime alimentar corporativo. Basear a alimentação no comércio internacional contribui para as fragilidades em países de menor desenvolvimento e dependentes da importação de alimentos (Dias; Amorim; Barbosa; Lima, 2022).
Neoextrativismo, pandemia e América Latina
Como explorado na seção anterior, o regime alimentar corporativista condiciona os países à dependência do comércio internacional para a garantia da segurança alimentar e nutricional. Para além disso, as economias agroexportadoras se consolidam num local de serventia dentro do sistema internacional. Nesse sentido, a divisão internacional do trabalho extrapola os limites territoriais criando condições para o exercício de livres forças de mercado no mundo, possibilitando que países desenvolvidos imponham seus interesses a fim de fortalecer padrões de dominação imperial e de acumulação por espoliação (Harvey, 2005). Uma das características desse modo de produção dentro do regime alimentar corporativista é a
transnacionalidade das corporações.
Os grandes conglomerados industriais de países ricos transferem suas produções para países em desenvolvimento. Em geral, os países escolhidos são aqueles com grande potencial de extração de recursos naturais, facilidades fiscais e mão de obra barata. Esses países são inseridos na divisão internacional do trabalho como fornecedores de matéria-prima. A exemplo dos países latino-americanos e das práticas de mineração, agronegócios, pesqueiras e monoculturas florestais (Barbosa, 2017). O modelo econômico vigente, portanto, contribui para a degradação ambiental e desastres como contaminação de água e solo, desflorestamento e redução de áreas pesqueiras (Barbosa, 2017). Além disso, a forma como os recursos naturais são explorados pode favorecer o surgimento de doenças, como a Covid-19.
As forças produtivas baseadas na extração e exploração dos recursos naturais são inerentes à acumulação capitalista, e esse modelo caracterizado pela imanência do capital foi chamado por Wallerstein (1979) de sistema-mundo, o qual estrutura-se mediante a divisão internacional do trabalho e envolve as economias por meio de uma teia. As grandes corporações são responsáveis por movimentar o sistema econômico internacional. (Wallerstein, 1979). É nesse cenário que as cadeias globais de commodities se tornam organizadas pelo agronegócio especializado em agroinsumos. Diferente dos regimes anteriores, que utilizavam os alimentos para garantia de uma hegemonia mundial, o regime corporativista busca a hegemonia de mercado e assegurar a manutenção das rotas transnacionais de capital e de commodities (McMichael, 2016). Na América Latina, esses megaempreendimentos do capital intensivo estão associados tanto às corporações internacionais quanto às “translatinas” como a Petrobras e a Yacimientos Petrolíferos Fiscales (YPF).
No sistema-mundo os países periféricos são dependentes financeira e tecnologicamente dos países do centro, dependência essa construída desde o primeiro regime alimentar e amplificada no regime corporativista. De acordo com Barbosa (2017), é justamente neste cenário que ocorre a consolidação do neoextrativismo. Ele surge nas novas dimensões do extrativismo no século XXI, acrescido de diferentes atividades, atores nacionais e transnacionais, resistências sociais e do questionamento do aumento da fronteira das commodities, da disputa e do conflito, frutos da acumulação de capital baseada na pressão sobre bens naturais, retomando uma visão desenvolvimentista.
O neoextrativismo contemporâneo pode ser caracterizado como modelo de desenvolvimento baseado na superexploração de bens naturais, cada vez mais escassos, em grande parte não renováveis, assim como na expansão das fronteiras de exploração para territórios antes considerados improdutivos do ponto de vista do Capital. Ele se caracteriza pela orientação da exportação de bens primários em grande escala, incluindo hidrocarbonetos (gás e petróleo) metais e minerais (cobre, ouro, prata, estanho bauxita e Zinco, entre outros) e produtos ligados ao novo paradigma agrário (soja, cana-de-açúcar). [...] O neoextrativismo também é um modelo sociopolítico e territorial, passível de ser analisado em escala local ou regional (Svampa, 2019, p. 33).
O neoextrativismo toma força na América Latina num contexto de mudança marcada pelo Consenso de Washington, o que Svampa (2019) batizou de Consenso das Commodities. Apesar de diferentes, ela aponta uma semelhança: o caráter adaptativo da economia latino-americana em relação aos diferentes ciclos de acumulação do capital. E, portanto, a reafirmação desta em seu lugar na divisão internacional do trabalho numa época de valorização da exportação em larga escala de bens primários, do neoliberalismo, de crescimento econômico e da expansão do consumo (Svampa, 2019).
Contudo, o extrativismo em si não é um fenômeno novo, é um modelo exportador cujas raízes remontam à colonização da América Latina pela Europa e aos primórdios do capitalismo (Svampa, 2019). Para Alberto Costa (2012, p. 2), “o extrativismo é uma modalidade de acumulação que começou a ser forjada maciçamente há quinhentos anos”. Assim, o extrativismo não é uma fase do capitalismo ou um problema de certas economias subdesenvolvidas, é um traço do capitalismo como economia-mundo. Gudynas (2015) trata o extrativismo como um modo de produção, não como um modo de apropriação. Nesse sentido, os ciclos extrativistas são fruto das adequações dos países do sul na produção/extração de matérias-primas demandadas pelo mercado mundial. Dessa forma, nota-se que as práticas extrativistas estavam consolidadas na América Latina antes mesmo do estabelecimento do primeiro regime alimentar. A exploração das colônias tinha como uma das principais funções arrebanhar o suprimento de alimentos de luxo para a classe rica.
O extrativismo representa a dependência no mercado mundial, a destruição de bases ecológicas, a externalização de gastos sociais e o desprezo aos direitos de minorias (Gudynas, 2015). Com a nova roupagem do extrativismo no século XXI, as práticas neoextrativistas se consolidam no seio do regime alimentar corporativista. Os países latino-americanos se mantêm no mercado internacional como exportadores de commodities, sobretudo, as commodities minerais e agropecuárias. Entretanto, o modelo agroexportador implementado por essas economias demonstrou fragilidades, visto que depende da demanda dos países industrializados e está sujeito à oscilação do preço internacional das commodities. Nesse sentido, a deterioração dos termos de troca da economia agroexportadora é uma das principais causas da dificuldade em superar o subdesenvolvimento. Apesar de muitos países latinos terem conquistado sua independência política, continuam no papel de servir o poder colonial (Svampa, 2019).
Assim, ainda que durante a conjuntura econômica favorável – até pelo menos de 2013 – os governos latino-americanos tivessem investido em práticas econômicas extrativistas, destacando as vantagens comparativas no auge do boom das commodities, esse investimento não foi suficiente para suprimir o vão da desigualdade. Ele foi realizado independente da inclinação ideológica, pois o neoextrativismo atuou como homogeneização das políticas da região mediante práticas neoliberais. E também favoreceu a coexistência de governos progressistas, que estabeleciam práticas questionavelmente liberais, e de governos de matriz conservadora, em meio ao neoliberalismo. Para Alberto Acosta, esses governos que praticam o neoextrativismo progressista, o neoliberalismo transgênico são característicos de um Estado que desempenha um papel ativo na captação do excedente e na redistribuição, garantindo um nível de legitimação social, mas com os impactos sociais e ambientais negativos. Isso explica a melhora dos dados sociais latino-americanos até, pelo menos, 2015. Contudo, a redistribuição sozinha não é capaz de modificar o local histórico que a região ocupa na divisão internacional do trabalho e não gera mudanças econômicas estruturais para alterar isto, visto que o capital investido para combater o subdesenvolvimento vem da própria fonte do subdesenvolvimento. Como defendido por Gudynas, o extrativismo não é uma fase até o desenvolvimento, ele faz parte do sistema capitalista, logo, não é por meio de práticas neoextrativistas que países em desenvolvimento irão alcançar o desenvolvimento e o crescimento dos índices sociais (Acosta; Brand, 2018). No caso da fome, por exemplo, os recursos para o combate vêm da fonte que a intensifica.
O sistema agroalimentar situado dentro do regime corporativista funciona com base no modelo neoextrativista. Os alimentos, para além de comida, são commodities para a produção de diversos insumos lucrativos como combustíveis. A acumulação capitalista demanda o avanço das forças produtivas, e esses avanços do modelo econômico corrente estão associados, também, à degradação ambiental e de direitos sociais (Svampa, 2019). Tais fatores explicam como há fome numa região produtora de alimentos: a maneira que os alimentos são produzidos e comercializados dentro do sistema capitalista não possibilita que as mudanças sociais ocorram de modo estrutural a fim de garantir uma diminuição das vulnerabilidades na América Latina. Com a crise da Covid-19, o sistema alimentar frágil da região não foi capaz de suportar os abalos causados pela pandemia, acarretando um aumento exorbitante da fome e da Insegurança Alimentar.
Considerações finais
Josué de Castro (1961) considera que o tabu da fome está amparado em razões profundas que permeiam os interesses econômicos de minorias dominantes, e que a consideram um sintoma puramente econômico e não um fenômeno do interesse social. A fome seria, então, produto da desumanização promovida pelo colonialismo, por processos de monoculturas e latifúndios. Assim, as razões da fome na América Latina são mais expressivas que as conexões com a pandemia. Portanto, é possível dizer que o neoextrativismo é uma categoria analítica latina, um conceito que aborda as relações de poder e de disputa e as assimetrias existentes dentro do sistema internacional, considerando as responsabilidades compartilhadas entre o norte e o sul global. Parte de uma crítica e da reflexão sobre o extrativismo, fruto da invenção europeia e da expansão do capital (Svampa, 2020). É também, associado à conquista e ao genocídio da América Latina, uma região marcada pelas consequências da imposição forçada dos ciclos econômicos exigidos pelo capital.
Nos últimos anos (2000-2015), apesar do esforço dos governos progressistas latino-americanos em ampliar o gasto público no combate à pobreza com políticas públicas, principalmente voltadas ao aumento de salários e consumo, a desigualdade social e a concentração de terras permaneceram constantes. A tentativa neoextrativista de esquerda de manter a exploração da terra, principalmente após o Consenso das Commodities, não foi suficiente para controlar as desigualdades estruturais geradas pela exploração do capital na produção de produtos primários agropecuários. Demonstrando a falha do neoextrativismo em superar as mazelas do extrativismo, apesar do salto da matriz produtiva e do crescimento econômico, a redistribuição não foi realizada de maneira satisfatória. Com a desvalorização das commodities, a balança comercial da América Latina foi desregulada, levando a região a uma crise econômica (Svampa, 2019).
A crise, mais uma vez, afetou os indicadores sociais da América Latina e, assim, as vulnerabilidades existentes em 2020 foram ampliadas pela pandemia. Essa situação reitera a necessidade de repensar o sistema agroalimentar e a maneira que o neoextrativismo é aplicado. De toda forma, Josué de Castro (1961) alertava que os desgastes humanos produzidos pela fome são maiores do que o de guerras e epidemias: “[...] as perdas de vida causadas pela peste ou pela guerra costumavam ser reparadas num prazo médio de dez anos, enquanto, em seguida às grandes fomes, os sobreviventes permanecem destroçados pelo resto de suas vidas” (Castro, 1961, p. 47). As consequências da Covid-19 a longo prazo ainda estão sendo analisadas, contudo, os impactos da fome no organismo humano já são conhecidos. A causa da fome em 268 milhões de latino-americanos também está sendo avaliada, e é preciso pensar soluções sistêmicas para além da realidade capitalista.
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Marcelly Thaís Marques Ribeiro Bacharel em Relações Internacionais pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB). MBA em Gestão de Projetos e Metodologias Ágeis pela Pontifícia Universidade Católica - Rio Grande do Sul. Graduanda em Direito pela Universidade Estadual da Paraíba. Integrante do Grupo de Estudos e Pesquisa FomeRI - UFPB. E-mail: cellytmr@gmail.com Lattes: http://lattes.cnpq.br/1596428822204656 ORCID: https://orcid.org/0009-0000-6023-3875 Thiago Lima da Silva Atualmente é Coordenador de Cooperação Internacional no Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar. Foi Coordenador de projeto na Força Tarefa para o estabelecimento da Aliança Global contra a Fome e a Pobreza pela Secretaria de Assuntos Internacionais do Ministério da Fazenda. Professor Associado do Departamento de Relações Internacionais da UFPB. Docente permanente do Programa de Pós-Graduação em Gestão Pública e Cooperação Internacional (PGPCI) e do Programa de Pós-Graduação em Ciência Política e Relações Internacionais (PPGCPRI) da UFPB. Doutor em Ciência Política pela Unicamp, Mestre em Relações Internacionais pelo Programa de Pós-Graduação 'San Tiago Dantas' (UNESP, UNICAMP, PUC-SP), Graduado em Relações Internacionais pelo Unibero. Pesquisador do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia para Estudos sobre os Estados Unidos (INCT-INEU). Coordenador do Grupo de Pesquisa sobre Fome e Relações Internacionais (FomeRI) da UFPB. Membro Associado do Instituto Fome Zero. ORCID: https://orcid.org/0000-0001-9183-3400 |
Revista IDeAS, Rio de Janeiro, volume 19, 1-27, e025002, jan./dez. 2025 • ISSN 1984-9834
[1] O Módulo de Pesquisa Fies (Fies-SM) é composto por oito perguntas sobre o acesso da população à alimentação adequada. Os participantes são questionados se nos últimos 12 meses houve algum momento em que por falta de dinheiro ou outros recursos:
1. Você estava preocupado que não teria comida suficiente para comer?
2. Você não conseguiu comer alimentos saudáveis e nutritivos?
3. Você comeu apenas alguns tipos de alimentos?
4. Você teve que pular uma refeição?
5. Você comeu menos do que achava que deveria?
6. Sua família ficou sem comida?
7. Você estava com fome, mas não comeu?
8. Você ficou um dia inteiro sem comer?
[2] Dados retirados do The State of Food Security and Nutrition in The World 2022.
[3] Média ponderada dos seguintes países: Argentina, Bolívia (Estado Plurinacional da Bolívia), Brasil, Chile, Colômbia, Costa Rica, El Salvador, Equador, Guatemala, Honduras, México, Nicarágua, Panamá, Paraguai, Peru, República Dominicana, Uruguai e Venezuela (República Bolivariana da Venezuela).
[4] Os valores de 2021 correspondem a projeções.
[5] Diferente da escalada adotada pela FAO quanto à Insegurança Alimentar Severa e à Insegurança Alimentar Moderada, no Brasil a classificação se divide em Insegurança Alimentar Leve, Insegurança Alimentar Moderada e Insegurança Alimentar Grave.
[6] a) média simples por sub-regiões (último ano disponível); b) (Em porcentagens da população total).