Artigo original • Revisão por pares • Acesso aberto

O corredor logístico do Tapajós, investimentos em infraestrutura e o modo de vida de povos tradicionais[1]

The Tapajós logistics corridor, infrastructure investments and traditional people’s way of life

Gustavo Silva de Azevedo, Karina Yoshie Martins Kato

Resumo

O artigo tem como objetivo trazer uma reflexão acerca da construção e consolidação do Corredor Logístico do Tapajós (que conecta o Mato Grosso ao Pará) como principal caminho para a exportação das commodities produzidas no Norte do estado do Mato Grosso, bem como sua relação com os modos de vida dos povos tradicionais. Para isso, por meio de uma extensa revisão bibliográfica e da análise de notícias de jornais, analisamos os impactos e os embates em torno da construção e alocação das infraestruturas que compõem o Corredor Logística do Tapajós, como a rodovia Cuiabá-Santarém (BR-163); a Ferrogrão (EF-170); e as Estações de Transbordo de Carga instaladas no município de Miritituba, às margens do rio Tapajós. Nesse sentido, concluímos que, apesar das promessas de desenvolvimento e riqueza trazidas com a construção do Corredores Logísticos, ele funciona principalmente como um elemento fundamental para a consolidação dos novos mecanismos de acumulação e apropriação de terras. Enquanto isso, alteram as lógicas dos territórios, priorizando a movimentação das mercadorias em detrimento da saúde, bem-estar e sociabilidades dos povos afetados.

Palavras-chave: Arco Norte, mercado de terras, Itaituba.

Abstract

The article aims to reflect on the construction and consolidation of the Tapajós Logistics Corridor (connects Mato Grosso to Pará) as the main route for the export of commodities produced in the north of the state of Mato Grosso, as well as its relation with the ways of life of traditional peoples. To this end, through an extensive bibliographical review and analysis of newspaper reports, we analyzed the impacts and conflicts surrounding the construction and allocation of infrastructure that makes up the Tapajós Logistics Corridor, such as the Cuiabá-Santarém highway (BR-163); Ferrogrão (EF-170); and the Cargo Transshipment Stations installed in the municipality of Miritituba, on the banks of the Tapajós River. In this sense, we conclude that, despite the promises of development and wealth brought with the construction of the Logistics Corridors, it functions mainly as a fundamental element for the consolidation of new mechanisms of land accumulation and appropriation. Meanwhile, they change the logic of the territories, prioritizing the movement of goods to the detriment of the health, well-being and sociability of the affected people.

Keywords: Arco Norte, land market, Itaituba.


Submissão:
19 dez.  2022

Aceite:
29 mai. 2024

Publicação:
17 set. 2024

Citação sugerida

AZEVEDO, Gustavo Silva de; KATO, Karina Yoshie Martins. O corredor logístico do Tapajós, investimentos em infraestrutura e o modo de vida de povos tradicionais. Revista IDeAS, , Rio de Janeiro, v. 18, p. 1-24, e024003, jan./dez. 2024.

Licença: Creative Commons - Atribuição/Attribution 4.0 International (CC BY 4.0).


Introdução

Neste trabalho, partimos do debate sobre o neoextrativismo e o Consenso das Commodities (Svampa, 2019; Gudynas, 2015; Gudynas, 2012), para caracterizar algumas das principais dinâmicas que marcam a economia brasileira ao longo do século XXI. Procuramos discutir a ligação entre as relações internacionais e a inserção brasileira no cenário internacional sem perder de vista sua intersecção com as mudanças no uso do solo nos territórios, fruto da expansão de atividades voltadas à exportação. O objetivo do artigo é problematizar as infraestruturas que formam o Corredor Logístico do Tapajós, que conecta o Norte do Mato Grosso ao Pará, pontuando a maneira como a sua construção e o seu funcionamento atropela o modo de vida de povos tradicionais afetados.

A seguinte pergunta nos orienta ao longo do texto: de que maneira as infraestruturas que compõem o Corredor Logístico Tapajós “atropelam” o modo de vida dos povos e comunidades tradicionais e entram em choque com as suas diversas territorialidades? Usamos o termo “territorialidades” para nos referir ao “esforço coletivo de um grupo social para ocupar, usar, controlar e se identificar com uma parcela específica de seu ambiente biofísico” (Little, 2005, p. 253).

Como metodologia para o trabalho, realizamos levantamento bibliográfico a respeito do tema de Corredores Logísticos no Norte do Brasil. A busca foi feita em alguns dos principais indexadores de trabalhos acadêmicos como: Google Scholar, por meio do software Publish or Perish, e o catálogo de teses e dissertações da Capes. Nesse sentido, as palavras-chave utilizadas para isso foram: Arco Norte; Corredores Logístico; Estrada de Ferro Carajás (EF-496); Ferrovia Norte Sul (EF-151); Ferrovia de Integração Oeste-Leste (Fiol); Ferrogrão (EF-170); Porto Velho (RO); Miritituba (PA); Santarém (PA); Barcarena (PA); Itacoatiara (AM); Manaus (AM); Porto de Itaqui (MA); Rodovia Cuiabá-Santarém (BR-163); Rio Tapajós; Hidrovia Tapajós-Amazônia; Matopiba; Itaituba; Miritituba; Sinop; Sorriso; Lucas do Rio Verde. Dessa forma, foram catalogados ao todo 225 trabalhos acadêmicos, referentes à logística e seus impactos, divididos por área do conhecimento.

Outra fonte de pesquisa foi o levantamento de mídia e matérias de jornais. Foram monitoradas notícias de quatro jornais de grande circulação: Valor Econômico, Folha de S.Paulo, O Estado de S. Paulo e CartaCapital. Todas as matérias e reportagens encontradas entre os meses de dezembro de 2019 e dezembro de 2021 foram organizadas em um arquivo que circula semanalmente entre todos os integrantes da pesquisa e do Gemap e, depois, arquivado como material de pesquisa em um banco mais amplo de notícias relacionadas à temática do Grupo.

É de nosso conhecimento que as publicações de jornais não são tão criteriosas em sua metodologia e análise quanto artigos científicos ou trabalhos derivados de pesquisa acadêmica, como teses e dissertações. Entendemos e reconhecemos aqui todas as limitações pertinentes ao uso de notícias de jornais como fontes informativas para um trabalho acadêmico, e delas desconfiamos. Contudo, decidimos mantê-las como fontes de informação, ponderadas suas ressalvas, por acreditarmos que são ainda uma boa fonte complementar para tratarmos de temáticas contemporâneas, sobre as quais os trabalhos científicos ainda são escassos. Sempre que possível, procuramos conferir as informações obtidas em fontes jornalísticas com outros documentos. Ademais, entendemos que não obstante suas fragilidades, essas matérias são uma excelente fonte para mapearmos os discursos dos principais atores atuantes no campo das infraestruturas logísticas.

A construção de rodovias, portos, ferrovias e outras infraestruturas para a exportação de commodities é um processo antigo que apresenta traços de continuidades e descontinuidades e cuja origem remete ao período colonial. Não obstante as continuidades, nossa pesquisa entende que há mudanças importantes derivadas do contexto de valorização das commodities no mercado internacional com a virada dos anos 2000. São alguns traços novos, a maior velocidade e volume com que terras são convertidas para a implantação de infraestruturas logísticas nos tempos recentes; o fato de boa parte dessas transações ocorre hoje num contexto de Estados nacionais independentes; e a consideração de que vivenciamos hoje um processo crescente de financeirização da agricultura e da terra, com a presença mais numerosa de investidores institucionais como fundos de pensão e fundos de investimentos, entre outros (Sassen, 2016; Leite; Flexor, 2017, p. 21). Esses investidores são atraídos pela materialidade da terra, visando tanto ao acesso a matérias-primas (que passaram a se valorizar aceleradamente no início do século XXI) quanto aos ganhos especulativos, transformando a terra num ativo financeiro.

Nos apoiamos aqui no entendimento de que o mercado de terras e as transações de compra e venda de terras por governos ou empresas estrangeiras, no período atual, adquirem características específicas e contam com um amplo e variado apoio do Estado por meio de práticas, marcos legais e instituições. A partir de meados dos anos 2000, num período que a literatura cunhou como o boom das commodities, as transações de terras apresentaram novos moldes. A crise de 2008/2009, por outro lado, abriu espaço e acelerou novas estratégias de acumulação com a terra e recursos naturais conectados com os mercados financeiros, o que na literatura especializada foi apelidado de land grabbing ou açambarcamento de terras. Esses novos interesses que recaem sobre a terra associam-se ao boom das commodities. Ou seja, em meio a um período em que essas mercadorias se tornaram mais atrativas nos mercados internacionais, impulsionadas por demandas múltiplas (produtivas, especulativas, ambientais, climáticas, energéticas) e fruto, sobretudo, do peso da China, multiplicaram-se os interesses que recaíram sobre as terras (Flexor; Leite, 2017, p. 22)

A expansão geográfica da produção do agronegócio e de toda a infraestrutura logística que permite o encurtamento das distâncias entre produção e consumo, vem contribuindo com a conformação de um mercado global de terras cujo motor está na expansão da fronteira agrícola em diversos países do Sul global e na incorporação de terras antes ocupadas por pequenos agricultores e comunidades tradicionais às cadeias globais de produção de commodities. A contrapartida disso é a acentuação das “microexpulsões”[2] de comunidades e agricultores familiares das áreas rurais, a toxicidade da terra e da água ao redor das plantações instaladas nas terras adquiridas e a acentuação da condição de insegurança alimentar” (Sassen, 2016, p. 101). Essas expulsões ocorrem pela resistência ou pela impossibilidade desses atores em serem integrados ao processo de racionalização das práticas produtivas em torno do agronegócio, isto é, por uma não “obediência às regras sugeridas pelas atividades hegemônicas, sem cuja utilização os agentes recalcitrantes acabam por ser deslocados (Santos, 2018, p. 89).”

É nessa conjuntura que procuraremos olhar com mais calma para o papel das infraestruturas logísticas na expansão da fronteira agrícola no Brasil, buscando destacar alguns elementos que nos permitem entender como elas determinam a expansão da fronteira agrícola e influenciam os mercados fundiários regionais. Com a expansão física dessas infraestruturas, cortando territórios, chamamos a atenção também para o papel do Estado na conformação de ambientes políticos e institucionais favoráveis aos investimentos extrativos e de infraestrutura. Como afirma Sassen (2016), o mercado global de terras envolve: “o desenvolvimento de infraestrutura igualmente vasta para permitir vendas e aquisições, obter posse ou direito de arrendamento, desenvolver instrumentos legais apropriados e até pressionar para a criação de novas leis” (Sassen, 2016, p. 100). Sara Safransky e Wendy Wolford (2011) ainda reconhecem em seus trabalhos que a grande quantidade de acordos por terras na América Latina pode estar relacionada com novos mecanismos de acumulação, extração e alienação envolvendo as terras e os recursos naturais. Entre os vários mecanismos de acumulação descritos por elas está a construção de grandes corredores de infraestrutura em todo o continente.

1 Megaprojetos no Corredor Logístico do Tapajós

A criação de rodovias com o objetivo de ocupar o interior do país, foi um relevante fenômeno brasileiro durante boa parte do século XX. No entanto, presenciamos, a partir dos anos 2000, novos arranjos que trouxeram mais uma vez à pauta a necessidade de “construir caminhos para o desenvolvimento”, por meio da abertura de estradas, portos e ferrovias. Dessa vez, a lógica que impulsiona esses projetos é “encontrar rotas mais rápidas entre as zonas de expansão dos monocultivos e o novo destino prioritário da soja, a China” (Aguiar, 2018, p. 175). Nesse contexto, surgiu a necessidade de desafogar o porto de Santos, saída mais utilizada para a exportação da produção do Centro-Oeste até então (Figura 1), construindo novas saídas para a produção no Norte e Nordeste do país, ou pelo chamado Arco Norte. Apresentamos a seguir a rota até então consolidada para o escoamento da produção de grãos do Mato Grosso pelo Sudeste. A Figura 2, mostra a principal alternativa para desafogar o porto de Santos: o Corredor Logístico do Tapajós.

Figura 1 – Corredor Sudeste (Eixo Santos) – Principal rota para a exportação da produção do Norte do Mato Grosso antes da consolidação do Corredor Tapajós

Fonte: Brasil61, 2019.

Figura 2  Corredor Norte (Eixo Tapajós)

Fonte: Brasil61, 2019.

É possível constatar que os países chamados “emergentes” na nova conjuntura vêm se tornando os novos protagonistas dos investimentos voltados para a construção de megaprojetos de infraestrutura. A China, por exemplo, investiu mais em infraestrutura entre os anos de 2004 e 2008, do que durante todo o século XX. Embora nossa logística ainda seja majoritariamente rodoviária, essa tendência também foi observada no Brasil, que construiu quase o dobro de ferrovias, no decorrer da primeira década dos anos 2000, em relação à década de 1990 (Aguiar, 2017, p. 11-12).                

                Nesse sentido, o cenário de alta valorização do preço das commodities, uma economia primário-exportadora, e a força das ideias neoliberais fortaleceram, no Brasil, a lógica de um desenvolvimento baseado na construção de infraestruturas para viabilizar a extração de commodities. Assim, o Estado passou a ter como prioridade a alocação das empresas, a fluidez de bens e mercadorias para atender às demandas do mercado e à atração de investimentos nacionais e internacionais. Dessa forma, a construção de corredores segue o raciocínio de Milton Santos sobre a instalação de empresas globais no território. No mundo globalizado, estradas, ferrovias e portos são vistos como “salvadores dos lugares”. Desse modo, a difusão do discurso de “espaços vazios” que precisam se desenvolver, reforçado e conformado pelo Estado (Wesz; Kato et al., 2021), dá aos corredores um caráter de indispensabilidade para a modernização do território e os leva à posição de única “saída” para o desenvolvimento.

                Não é à toa que as políticas públicas de apoio à estruturação de infraestruturas voltaram a ganhar força nos anos 2000. Durante o governo Lula (2003-2010) foi criado o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento). No governo Dilma, o PAC II deu continuidade à política de investimentos estatais, por meio dos bancos públicos, porém, com a crise política e a diminuição dos investimentos do Estado, foi instituído o Programa de Investimento em Logística. Durante o governo Temer, foi criado o Programa de Parcerias de Investimentos. Entre outras obras, a Ferrovia Ferrogrão, que liga Sinop (MT) a Miritituba (PA), aparece como um dos principais projetos de infraestrutura.  Ao longo do governo Bolsonaro, a pavimentação de rodovias federais ganhou destaque nas propagandas do governo, principalmente as obras na BR-163. Portanto, podemos observar que “poucos interesses capitalistas são tão imunes a mudanças de governo e tão plasmados na agenda pública quanto os logísticos” (Aguiar, 2018, p. 179).

Os Estados têm, em suas distintas escalas, dedicado apoio por meio de diferentes práticas e instrumentos: ao selecionar os “espaços” em que serão implementados por meio de projetos de atração de investimentos; ao construir e reforçar a narrativa de “espaços vazios” que precisam de dinâmicas exógenas para se desenvolverem; ao flexibilizarem as legislações trabalhistas e ambientais (incluindo as omissões na aplicação de leis que poderiam barrar esses investimentos); ao implementarem e desenharem projetos de investimentos públicos em logística e fomentarem parcerias público-privadas; ao concederem isenções fiscais; ao atuarem na desapropriação de áreas de seus antigos ocupantes e ao destinarem terras públicas para esses novos projetos, entre outras (Wesz Jr; Kato et al., 2021).

Portanto, o interesse pela construção de novas infraestruturas e modernização de projetos já existentes, atende à exigência de fortes grupos de poder e interesses econômicos diversos com o objetivo de auxiliar a moderna dinâmica de exploração, produção e circulação de mercadorias (Brito; Castro, 2018, p. 53). Assim, constatamos que a narrativa sobre os corredores promove uma ideia de conectividade do território, aumento da velocidade e, por conseguinte, ganho para todos. No entanto, a fluidez, nos termos de Milton Santos, está apenas ao alcance de alguns poucos agentes que são os “detentores efetivos da velocidade” (Santos, 2018).

1.1 BR-136

        
Inaugurada em 1876, a rodovia Cuiabá-Santarém – a BR-163 (Figura 3), representa um dos principais projetos do desenvolvimentismo militar na Amazônia. Ao longo dos últimos anos, as condições de tráfego na rodovia foram constantemente criticadas por produtores e caminhoneiros que desejavam transportar a produção de grãos do Norte do Mato Grosso até os portos do Pará. Nessa perspectiva, a conclusão da pavimentação – visto que apenas um trecho da rodovia era pavimentado – e a duplicação da rodovia passaram a ser as principais demandas do capital para o empreendimento.

Figura 3 – A nova rota para o Norte - BR-163

Fonte: Valor Econômico, 2014.

Como destaca Margarit (2013), a construção da rodovia trouxe impactos significativos para os municípios em seu entorno. A partir da construção da BR-163, a região que está sob influência da rodovia passou a conviver com novas dinâmicas, derivadas do processo de ocupação e dos novos e intensos fluxos de capital. Dentre as novas dinâmicas observadas na região destacam-se:

tráfico de metais preciosos; avanço ilegal sobre os estoques naturais da região, com desmatamento acima dos níveis definidos legalmente e invasão de áreas de preservação ambiental; desintegração e conflitos entre ações governamentais; grilagem de terras; precaríssimas políticas de ordenamento territorial, objeto de muitas disputas pela posse da terra e para ter acesso a políticas de crédito governamental; conflitos com etnias indígenas, em defesa de suas terras e culturas; atuação de movimentos sociais ambientalistas contrários à exploração predatória, entre tantos outros problemas (Brito; Castro, 2018, p. 254).

A autora nos confirma que “as atividades produtivas rapidamente foram expandidas e modernizadas, transformando grande parte das terras no entorno da rodovia em importantes áreas de produção de grãos para exportação, notadamente, a soja” (Margarit, 2013, p. 169). A rodovia atuou como importante fator de integração da produção regional ao mercado internacional, tornando a soja produzida pelos agricultores mato-grossenses mais competitiva e reorganizando o território com vistas à produção e ao armazenamento de grãos.

Atualmente a rodovia exerce uma grande influência sobre os estados do Mato Grosso e do Pará e seus impactos se estendem pela Região Amazônica. Mesmo antiga, a obra nunca deixou de estar entre os principais assuntos sobre logística no país e, nesse novo contexto de valorização – e de dependência – da exportação de produtos agropecuários, assume uma posição estratégica para a consolidação do modelo de desenvolvimento discutido neste trabalho. Como destaca Margarit (2013), a concepção economicista compreende que é necessário pavimentar a rodovia da maneira mais rápida possível, com o objetivo de viabilizar a exportação agropecuária, porém o tecido social afetado costuma ser lamentavelmente negligenciado. Muitas vezes, “as grandes empresas tratam apenas de realizar projetos socioambientais pontuais e esporádicos, com a finalidade de manter uma imagem positiva da corporação a respeito dessas temáticas” (Ibidem, 2013, p. 171).

1.2 Redução do preço do frete e a pavimentação da BR-163 no governo Bolsonaro

Um dos feitos mais comemorados pelo governo Bolsonaro, sem dúvida, foi a pavimentação da BR-163. Uma das principais demandas de agricultores e caminhoneiros – grupos que conformam a base política de Bolsonaro –, a obra era vista como essencial para diminuir os gargalos da produção de grãos no interior do país. Neste trabalho analisamos diversas reportagens que apontam o impacto da conclusão das obras da BR-163 em 2020 no preço do frete.

No ano de 2020, graças à pavimentação da BR-163 e à consequente diminuição do preço do frete, foi possível observar um aumento da produção de milho de 3,7 milhões, para 5,13 milhões de toneladas no mesmo período do ano passado. De acordo com Brito e Castro (2018), a conclusão da pavimentação da estrada já fez crescer o escoamento da soja colhida na safra de verão para os portos do Norte. No caso da soja, observamos a mesma tendência no ano de 2020. Portanto, a conclusão da BR-163 reduziu os valores do frete de forma estrutural[3].

Nesse sentido, concluímos que a pavimentação da rodovia foi um acontecimento fundamental para a consolidação do Arco Norte como saída para a produção agropecuária brasileira, especialmente a soja. Das 6,2 milhões de toneladas de soja e 1,3 milhão de milho exportadas no primeiro trimestre de 2020, aproximadamente 50% foram escoados pelos portos do chamado Arco Norte (Walendorff, 2020). Dessa forma, é possível notar que vem se tornando mais vantajoso para o produtor utilizar os portos do Norte, em vez dos do Sul e Sudeste.

1.3 Estações de transbordo de cargas e a questão hidroviária no rio Tapajós

                Atualmente, boa parte da soja que sai do Norte do Mato Grosso com destino aos portos do Arco Norte é transportada através dos terminais privados em Miritituba, no município de Itaituba, à direita do rio Tapajós. De lá, a produção é colocada em barcaças e levada para os portos de Barcarena (PA), Santarém (PA) ou, em alguns casos, para o porto de Santana (AP). É desses portos que a soja parte em direção ao Atlântico, tendo como principais destino China e Estados Unidos.
        O rio Tapajós está no centro das discussões sobre logística desde o início dos anos 2000. Em princípio,
tradings norte-americanas foram as pioneiras em instalar suas estações de transbordo de carga às margens do rio. Um dos marcos na consolidação dessa rota de escoamento da produção do Norte do Mato Grosso foi a instalação pela Cargill de um porto privado em Santarém no ano de 2003. Ela é uma das principais investidoras em infraestrutura portuária do país (Aguiar, 2017). Em seguida, os sojicultores do Sul do país começaram a se instalar no Baixo Amazonas. Esse fenômeno resultou na

expulsão dos muitos pequenos agricultores do campo o Planalto do Santarém e Belterra virou uma paisagem da soja. Sua chegada iniciou um grande esquema de grilagem, conhecido como “Faroeste”, a onde os próprios servidores do Incra estavam fornecendo títulos falsos e criando assentamentos sem moradores para beneficiar os sojicultures e as madeireiras (Comissão Pastoral da Terra, 2010). 

Movimentos sociais, como o Greenpeace e a Comissão Pastoral da Terra, se opuseram à presença da Cargill em Santarém. Um dos episódios mais notórios de resistência foi o bloqueio realizado em 2006 por ativistas do Greenpeace ao porto da empresa norte-americana, em Santarém, quando um grupo de cinco alpinistas tentou escalar as torres do terminal para estender uma faixa com os dizeres “Fora Cargill”.

Figura 4 – Grafite contra a Cargill

Fonte: Comissão Pastoral da Terra, 2010.

Em virtude da resistência das populações locais e de movimentos sociais enfrentada em Santarém, as tradings passaram a ter como preferência a instalação dos seus terminais em Itaituba  Miritituba (Aguiar, 2017). Foi nesse contexto que, em 2014, a Bunge/Amaggi – uma joint venture formada pelas duas gigantes – inaugurou seu terminal às margens do rio Tapajós, reforçando assim a nova rota para a exportação de soja (Barros, 2019). A partir disso, várias outras corporações foram se instalando no município de Itaituba, como: a Hidrovia do Brasil, a ADM, a Caramuru e a Cargill. Dessa forma, “a multiplicação dos portos e a valorização dos terrenos de Miritituba à margem do Tapajós sugerem como essa rota tem se configurado numa importante saída para os produtores do Norte do Mato Grosso em direção aos mercados internacionais” (Wesz; Kato et al., 2021, p. 13).

Figura 5  Empresas instaladas às margens do Rio Tapajós

Fonte: Valor Econômico, 2014.

                Como observa Aguiar (2017), as novas dinâmicas da região têm produzido alterações significativas no município de Itaituba e em seu entorno. A primeira delas, é a valorização no preço da terra, o que consequentemente tem produzido um choque entre o capital e as territorialidades dos povos do Tapajós. Segundo um triste relato da autora, em um terreno que estava sendo terraplanado para que ficasse à altura do rio era possível ver fragmentos de artefatos arqueológicos dos indígenas Munduruku, povo que, possivelmente, é um dos mais antigos a ocupar a região.

Alguns dos grafismos das cerâmicas encontradas nas escavações correspondem aos grafismos que os índios Mundurukus ainda hoje pintam sobre a própria pele (Aguiar, 2017, p. 38).

As compras das terras concretizavam a fricção de territorialidades antagônicas — do Estado, do capital e subalternas/insurgentes — tão incompatíveis que o desembarque de uma determinava a aniquilação da outra como tal e sua transformação. Os investidores e suas fontes de financiamentos vêm das partes mais diversas do mundo, se materializando ali em empreendimentos logísticos (Aguiar, 2017, p. 39).

Além dos povos indígenas, outros grupos são afetados pelas Estações de Transbordo de Carga (ETCs), como é o caso das “famílias que vivem da pesca, agricultura e do agroextrativismo que sofrem com a invisibilidade, o amplo desconhecimento de seus direitos” (Aguiar, 2017, p. 40). Nessa perspectiva, nos mesmos termos do que Coelho (2017) afirma sobre o funcionamento da estrada de ferro Carajás (PA), ferrovia que liga às minas de ferro do Pará ao Maranhão, constatamos que a infraestrutura voltada para a exportação de commodities vem inviabilizando os modos tradicionais de reprodução social nas margens do rio Tapajós (Coelho, 2017, p. 19). Portanto, vemos que, “com a introdução de atividades estranhas à realidade local, a partir da implantação de uma racionalidade técnica portuária” (Barros, 2019, p. 402), os impactos sociais desse empreendimento vão além das consequências materiais e estendem-se a relação cultural das comunidades tradicionais com o rio Tapajós.

Na comunidade de São Luiz do Tapajós, em Itaituba, às margens do rio Tapajós, os moradores da região estavam habituados a mergulhar no rio para pegar um peixe que é conhecido como cascudo. Com a pavimentação da BR-163 e a instalação das Estações de Transbordo em Miritituba (PA), município vizinho que fica na outra margem do rio Tapajós, os moradores mal conseguem enxergar o fundo do rio, em razão da qualidade da água, o que impossibilita que tal prática seja reproduzida.

Além disso, outros hábitos dos povos que vivem à beira do Tapajós parecem ameaçados pela consolidação das Estações de Transbordo de Cargas. Pescadores relataram em uma reportagem da revista Globo Rural que muitas vezes são obrigados a deixar determinada parte do rio para não atrapalhar os transportadores. Outros povos reclamam por não poderem reproduzir práticas que pautam suas vidas há muito tempo: “pescávamos com flecha aqui na frente. Hoje, não podemos mais. Sempre vem alguém e diz que a área é de alguma empresa” (Ribeiro, 2017).
        Além da questão do modo de vida das comunidades que vivem no/do Tapajós, há outras oito modificações importantes no município de Miritituba descritas por Barros (2019). Primeiro, o empreendimento provoca alterações no cotidiano da população local. Em segundo lugar, o aumento do fluxo migratório de pessoas em busca de trabalho para a região acarreta maior procura pelos, já precários, serviços públicos. Terceiro, as idas e vindas de caminhões todos os dias pela BR-163 criam uma pressão sobre as vias urbanas do município. Em quarto lugar, acontece uma modificação da paisagem e do uso do solo,

o que contribuiu para uma mudança da paisagem e da função da vila que surgiu como agrovila, onde as atividades primárias ligadas a pequena agricultura eram baseadas na subsistência dos assentados, com a implantação das Estações de Trasbordo de Cargas, grandes objetos de logística portuária passam a imprimir nova dinâmica a pequena vila localizada a margem direita do rio Tapajós (Barros, 2019, p. 403). 

Quinto, a presença das Estações de Transbordo de Carga gera uma forte pressão na rede de postos de combustíveis, em virtude do aumento da demanda causado pelas carretas que chegam todos os dias a Miritituba. Sexto, “as empresas passam a manter um controle territorial do rio para fins de operação das atividades ligadas ao transbordo das cargas” e isto tem como consequência a “limitação na atividade da pesca artesanal, praticada por pequenos pescadores de Miritituba” (Barros, 2019, p. 403). Sétimo, o fluxo de carretas provoca um aumento da poeira no município, essa é uma das reclamações que mais aparece nos textos analisados. Por último, “com a criação de novos bairros como Nova Miritituba e Jardim do Éden, onde novos migrantes buscam locais de moradias e oportunidades de trabalhos nas Estações de Transbordo de Cargas instaladas na vila” (Ibidem, 2019, p. 403), é possível observar uma expansão da rede urbana.
        É nesse contexto que
 as comunidades do Tapajós tentam resistir às transformações impostas pelas grandes empresas transnacionais com o aval – e muitas vezes em parceria – do Estado. Os Munduruku, por exemplo, povos indígenas que historicamente ocupam a região, representam um dos principais povos na luta contra esses empreendimentos. Em uma carta denominada “Carta do povo Munduruku contra os portos no Tapajós”, de 2 de julho de 2019, eles demonstram sua indignação com a alocação desses empreendimentos logísticos.
        A carta começa com a seguinte afirmação: “há mais de 519 anos os pariwat continuam invadindo as nossas terras. Antes chegavam com seus navios, hoje chegam com barcaças de soja”. Na carta fica clara a insatisfação dos Munduruku com a falta de consulta e o desrespeito à Convenção n
o 169 da OIT, aliás, como acontece em quase todos os megaprojetos logísticos.

Já instalaram seis portos ao redor de nosso rio Tapajós e nunca vieram nos dizer como seríamos impactados. Nós já estamos sendo afetados com tantas barcas enormes passando pelas nossas aldeias, não conseguimos mais pescar perto de casa, temos que ir cada vez mais longe para conseguir alimentar os nossos filhos. Estamos até proibidos de pescar perto de onde estão os portos, ou de atravessar para o outro lado do rio (Carta do povo Munduruku contra os portos no Tapajós, 2019).

Além de exigir que as consultas sejam realizadas da maneira correta, os Munduruku fazem exigências mais enfáticas:

Nós queremos que as empresas dos portos e os projetos de morte saiam do nosso território e nos deixem em paz, para trabalhar nas nossas roças, pescar nosso peixe, contar nossas histórias e construir nosso plano de vida. Não admitimos que a nossa vida e a saúde dos nossos filhos sejam trocadas por soja para alimentar os porcos e encher os bolsos dos empresários brasileiros e estrangeiros (Carta do povo Munduruku contra os portos no Tapajós, 2019).

1.4 A Ferrogrão

Nos últimos anos, membros do poder público e empresários brasileiros começaram a pensar alternativas para superar o que eles definem como “gargalos” logísticos na exportação da soja produzida do interior do país. É nesse contexto que, em 2012, começou a ser idealizada a construção de uma ferrovia que ligasse o Norte do Mato Grosso a Itaituba (PA), visto que as ferrovias que existiam até então eram consideradas insuficientes para absorver a crescente produção de grãos da região (Aguiar, 2017). Assim, a Ferrogrão se tornou uma das principais demandas dos produtores de soja, que veem nela a esperança do barateamento do frete e, assim, o consequente aumento no lucro e na competitividade do setor. Portanto, espera-se que com a implementação da ferrovia ela se torne, no lugar da BR-163, a melhor e mais barata opção para a exportação de soja.
        A Ferrovia é um empreendimento logístico que ainda não saiu do papel e que vem enfrentando muitos conflitos (sobretudo pelos seus impactos sobre áreas protegidas e terras indígenas). Contudo, a sua simples anunciação como um projeto prioritário já apresenta efeitos nas dinâmicas territoriais. Nesse sentido, os megaprojetos “vão provocando reordenamentos espaço-temporais nos territórios por onde estão previstos de cruzarem, mesmo muito tempo antes de se concretizarem” (Aguiar, 2017, p. 44). Isso acontece porque esses empreendimentos servem de “referência a investidores que engrossam frentes especulativas em busca de oportunidades de acumulação” (
Ibidem, p. 44).
        Ainda nos termos de Aguiar (2017), em um cenário de retração dos orçamentos públicos – em virtude, entre outros motivos, da PEC do teto de gastos
[4] –, a necessidade inflexível de alocar novos “megaprojetos de infraestrutura que assegurem o desenvolvimento capitalista tem justificado a canalização de programas e políticas públicas em prol da garantia de retorno ao investimento privado” (Ibidem, p. 12). Com o argumento de superar a desconfiança do mercado, o governo Bolsonaro, por intermédio do então ministro da Infraestrutura Tarcísio Freitas e sua equipe, criou um mecanismo inédito de subsídio para financiar o funcionamento da ferrovia. Dessa forma, serão 2,2 bilhões em recursos da União concedidos à empresa ganhadora do processo de licitação, com o objetivo de custear os “riscos não gerenciáveis” da ferrovia[5].
        
Para Steinbrenner e Castro (2018), o projeto da Ferrovia EF-170 se enquadra perfeitamente na lógica neoextrativista, principalmente por reforçar a tendência à atividade extrativa intensiva da monocultura da soja para exportação. Além disso, a relação entre neoextrativismo e a construção do Ferrogrão também fica evidente no papel dos grupos de poder político mais conservadores e na ação protagonista do governo na articulação e promoção do empreendimento.
        Vale aqui destacar que o impasse gerado pela sobreposição do projeto em áreas protegidas da região vem sendo contornado com a aprovação da Medida Provisória n
o 758[6],de 2016, que altera os limites do Parque Nacional (Parna) do Jamanxim, nos municípios de Itaituba e Trairão, ambos no Pará, e da Área de Proteção Ambiental (APA) do Tapajós, localizada nos municípios de Trairão, Jacareacanga, Itaituba e Novo Progresso, também no Pará (Aguiar, 2017; Brito; Castro, 2018).

1.5 Ferrogrão e a construção do terminal de Matupá

Existem duas possibilidades para a construção do projeto: a primeira tem apenas dois terminais ligando Sinop (MT) a Santarém (PA); e, a segunda, como consta nos documentos oficiais, refere-se a uma estação intermediária em Matupá (MT), região na qual a produção de soja já vem sendo expandida. Com a estação de Matupá, há expectativas de que a ferrovia resulte na diminuição significativa da pressão sobre a BR-163. Nesse sentido, com o terminal,

a Ferrogrão aumenta sua movimentação diária para 480 vagões ou 17,5 Mton por ano, e a BR-163 passaria a trafegar somente 24 kton anuais, ou o equivalente a 2 caminhões por dia com capacidade de 30 toneladas (Costa; Fernandes et al., 2021).

 

No centro dessa discussão está a rodovia MT-322 – uma das rodovias de acesso à BR-163, cujo traçado proposto cortará a Terra Indígena Xingu. A via foi construída na década de 1970 como parte do plano de integração da Amazônia. Hoje, a rodovia “tem como principal função auxiliar no escoamento da produção agropecuária da região, ligando a BR-163 (conhecida como Cuiabá-Santarém) à BR-158 (Costa; Fernandes et al., 2021, p. 1)”. É importante ressaltar que, apesar de se encontrar em operação, esse trecho, “não possui licenciamento ambiental e tampouco foram realizados os estudos de impacto ambiental sobre as populações indígenas desses territórios” (Ibidem, 2021, p. 1).

Figura 6  Projeto Ferrogrão (EF-170) com a construção do terminal em Matupá

Fonte: Instituto Socioambiental, 2020.

Além dos problemas com a pavimentação da rodovia, o seu principal entrave é a necessidade de atravessar o rio Xingu. Atualmente, a travessia é feita pela Terra Indígena Capoto-Jarina, que cobra uma tarifa a todos os não indígenas que desejam atravessar o rio em suas balsas. A construção de uma ponte sobre o rio Xingu é, hoje, uma das principais demandas dos produtores de grãos do estado. No entanto,

a proposta de construção da ponte no rio Xingu é rejeitada pelas associações indígenas, que afirmam que a substituição da balsa pela ponte os privará do controle sobre o acesso de terceiros a seus territórios, incorrendo no aumento descuidado do fluxo de veículos na estrada e, consequentemente, no aumento de pressões antrópicas sobre os territórios (Costa; Fernandes et al., 2021, p. 2).

                A nova estrada pretende facilitar o escoamento da produção de grãos até o terminal de grãos de Matupá previsto no projeto da Ferrogão, dividindo ao meio as terras indígenas do Xingu. O aumento do fluxo de caminhões sobre a possível ponte construída sob o rio Xingu – com o objetivo de conectar os municípios produtores de soja do estado do Mato Grosso – poderá resultar na “invasão e consequentemente no desmatamento nas terras indígenas da região” (Ibidem, 2021, p. 6). Além disso, utilizando o modelo SimAmazônia, estima-se que “mais de 230 mil hectares sejam desmatados até 2035 apenas dentro das terras indígenas do Leste do Mato Grosso, dos quais mais da metade desse desmatamento ocorreria somente no Parque Indígena do Xingu” (Ibidem, p. 6). Os autores destacam também que:

perdas econômicas advindas de emissões de CO2 pelo desmatamento situariam no patamar de US$ 1 bilhão (US$ 10/ton CO2) somente para as Terras Indígenas. Soma-se a isso a redução do volume anual de chuvas que em algumas regiões já atingiu uma diminuição de 48%, acarretando em redução de produtividade agrícola e geração de energia de Belo Monte, que pode cair a 25% do máximo da capacidade, e mais uma perda incalculável de serviços ambientais e da rica sociobiodiversidade da região (Costa; Fernandes et al., 2021, p. 6).

Portanto, apesar dos possíveis ganhos econômicos, deve ser considerado na análise de viabilidade econômica da ferrovia o impacto que esse terminal trará às populações indígenas do Xingu. A ocupação no entorno na Rodovia MT-322 resultará em impactos socioambientais significativos que não devem ser negligenciados, tão pouco diminuídos. Desse modo, nesse momento em que ainda não se iniciou a construção do projeto, é fundamental que façamos pressão para que os povos afetados não sejam “atropelados” e inviabilizados pelo empreendimento.

 

1.6 Ferrogrão e a questão da consulta prévia às comunidades

Assim como em boa parte dos megaprojetos, todo o processo de construção da Ferrogrão tem sido marcado pela falta de consulta prévia às comunidades atingidas, desobedecendo à determinação da Convenção no 169 da OIT[7] – a qual o Brasil é signatário. Como ressalta Brito e Castro (2018), a Convenção estipula que “ainda na fase de planejamento, seja levada em consideração a posição dos indígenas e das comunidades afetadas que não sejam indígenas” (Brito; Castro, 2018, p. 9).
        Esse cenário levou ao extremo a insatisfação dos indígenas Kayapó do Pará que, no dia 17 de agosto de 2020, chegaram a interditar por cinco dias a BR-163, em uma manifestação que tinha como motivação, entre outras coisas, a falta de consulta sobre a implementação do projeto para a construção da Ferrogrão, visto que o projeto prevê a construção de trilhos próximos às terras indígenas.
        Os indígenas também contestam o argumento utilizado pelo governo de que o projeto não gerará qualquer impacto sobre as Terras Indígenas Baú e Mekrãgnotire – segundo o governo os trilhos estão a 50 km de distância das TIs. No entanto, em entrevista ao Terra de Direitos, Mydjere Kayapó – liderança indígena local – afirma que a plantação de soja já está muito próxima das TIs e que, nas palavras dele: “se a ferrovia estiver pronta, vai chamar mais ainda esses fazendeiros que podem invadir nossas terras. E esses empresários não desmatam 2 ou 3 alqueires para plantar soja, eles desmatam mais de mil” (Schramm, 2020).
        Outro argumento interessante sobre a ausência de consulta é que, a partir da ideia de múltiplas colonialidades – colonialidade do poder, colonialidade do saber e colonialidade do ser – que permanecem ativas (Quijano, 2002), Steinbrenner e Castro (2018) apontam que o fato de não se traduzir os documentos do projeto técnico da Ferrogrão para as línguas indígenas, o que ofereceria mais possibilidade de informação para as comunidades que serão diretamente afetadas, é uma das formas de ação dessa colonialidade. Dessa maneira, “se desconhece e exclui (do planejamento) quem não se enquadra no padrão de modernidade capitalista” (Steinbrenner; Castro, 2018, p. 12). Por meio dessas práticas e discursos, a Ferrogrão é mais um dos empreendimentos que atropelam as comunidades tradicionais desde o momento de sua elaboração.

Conclusão

Dessa forma, observamos que a construção de Corredores Logísticos aparece como um elemento fundamental para a consolidação dos novos mecanismos de acumulação e apropriação de terras na virada do século XXI. Na nova fase do capitalismo extrativo, terras e recursos naturais encontram-se amplamente valorizados e o controle desses passa a ser um dos principais dilemas dos dias atuais. Nesse sentido, a periferia do sistema mundial passa a ter protagonismo no que diz respeito à construção de infraestruturas logísticas para exportação de commodities, na medida em que são necessários cada vez mais maiores volumes de matérias-primas para o mercado internacional. Em contrapartida, esses países, como é o caso do Brasil, enfrentam uma reprimarização de sua economia e uma grande pressão sobre seus recursos naturais e terras.

No Brasil, a Região Amazônica é cobiçada pelo capital, e sua fronteira produtiva vai gradativamente avançando sobre a floresta e os territórios dos povos tradicionais. Nesta pesquisa, olhamos para o Corredor Logístico do Tapajós e como as infraestruturas que compõem esse corredor trazem impactos significativos para as populações e o meio ambiente. Em virtude da recente pavimentação da BR-163, observamos uma forte valorização das terras no entorno da rodovia, o que teve como consequência o aumento do desmatamento, a grilagem de terras, além da ameaça à cultura dos povos amazônicos. Ao contrário do que era prometido, a rodovia não resolveu os problemas de pobreza e desigualdade da região, ao contrário, tem produzido graves impactos sobre a sustentabilidade humana e ambiental.

Marcada pela ausência de consulta prévia às comunidades atingidas, a Ferrogrão é um dos empreendimentos logísticos mais importantes a serem construídos nos estados do Pará e Mato Grosso. Existem dois cenários possíveis para a construção do projeto: o primeiro com a presença de um terminal intermediário em Matupá (MT); e, o segundo, somente com os terminais de Sinop (MT) e Santarém. Adicionalmente, o terminal de Matupá tem como consequência a divisão das Terras Indígenas Xingu ao meio.

Por último, foram analisados os impactos socioambientais causados pelas Estações de Transbordo de Carga (ETCs) que vêm transformando o Corredor Tapajós em um dos principais canais de escoamento de grãos do Norte do Mato Grosso. Nessas estações, a soja é transferida dos caminhões para as barcaças e segue pelo rio Tapajós em direção aos portos do Arco Norte. Esse grande projeto representa uma ameaça significativa à cultura e ao modo de vida dos povos indígenas, sobretudo os Munduruku, e a outras populações que vivem próximas ao rio, haja vista que o empreendimento impede que esses indivíduos utilizem o rio da maneira que tradicionalmente foram habituados.

É elementar pontuarmos, também, que a instalação de ETCs às margens do rio são responsáveis por: a) modificações no cotidiano da população local; b) aumento do fluxo migratório de pessoas em busca de trabalho para a região, o que acarreta uma maior procura pelos, já precários, serviços públicos; c) aumento do fluxo de caminhões pela rodovia BR-136; d) modificação da paisagem e do uso do solo; e) forte pressão na rede de postos de combustíveis; f) permitir que as empresas passem a exercer controle sobre o rio, o que impede que este seja utilizado pelos locais; g) aumento da poeira no município; h) expansão da rede urbana.

                Uma das principais razões pela aceitação da lógica de desenvolvimento liderado por infraestrutura está no seu potencial gerador de riquezas e empregos para os municípios envolvidos. No entanto, o que vemos é que o aumento do fluxo na rodovia e da produtividade em seu entorno “não vêm resolvendo a pobreza e a má distribuição de renda que atingem a maioria, assim como têm produzido sérios riscos para a sustentabilidade humana e ambiental” (Brito; Castro, 2018, p. 53). Ao mesmo tempo, a “cultura de povos amazônicos, atividades econômicas ligadas à pequena produção, populações tradicionais e comunidades ribeirinhas, os rios, a floresta estão sendo destruídas, ou passando por fortes e irreversíveis agressões” (Ibidem, p. 53).  

Os investimentos em infraestrutura logística alteram as lógicas dos territórios, priorizando a movimentação das mercadorias e reorganizando seu espaço visando à maior produção e escoamento de grãos, ao mesmo tempo que jogam para segundo plano as necessidades e demandas dos povos e comunidades tradicionais que habitam esses mesmos territórios. Com o acirramento da corrida por terras na virada do século XXI, conforme visto no início deste artigo, os desafios para a construção de um modelo de desenvolvimento mais inclusivo e ambientalmente sustentável tornam-se ainda mais urgentes e complexos, nos incitando a olhar para os investimentos em infraestrutura a partir do terreno em que eles serão instalados.

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Gustavo Silva de Azevedo

Doutorando em Sociologia pelo Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (IESP/UERJ), mestrado em Sociologia (IESP/UERJ) e bacharel em Relações Internacionais pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ).

E-mail: rondinelli.tosta@ifgoiano.edu.br

Lattes: http://lattes.cnpq.br/4572343201021185

ORCID: https://orcid.org/0000-0003-1788-3586

Karina Yoshie Martins Kato

Professora adjunta do Programa de Pós-Graduação de Ciências Sociais em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (CPDA/UFRRJ). Doutora em Ciências Sociais em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade pelo CPDA/UFRRJ.
E-mail: anirakato@yahoo.com
Lattes: http://lattes.cnpq.br/1487027132879542

ORCID: https://orcid.org/0000-0002-2963-8361

Revista IDeAS, Rio de Janeiro, volume 18, 1-24, e024003, jan./dez. 2024 • ISSN 1984-9834


[1] Esse artigo é produto de uma pesquisa de monografia defendida no curso de Relações Internacionais da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro que contou com dois anos e seis meses de financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro. Além disso, é fruto da participação nas atividades e discussões do Grupo de Estudos em Mudanças Sociais, Agronegócio e Políticas Públicas (GEMAP/UFRRJ).

[2] Deslocamento involuntário ou forçado de povoados, distritos de agricultura de subsistência e instalação de produções em regiões rurais, causado pela aquisição de grande porção de terra por empresários nacionais ou estrangeiros. Dessa forma, Sassen (2016) destaca que há um número crescente de pessoas desalojadas, migrantes rurais que saem de locais com economias de subsistência destruídas e, a longo prazo, muita terra morta. Essas pessoas acabam por se instalar em condições não ideais, como em favelas (Sassen, 2016, p. 101).

[3] PRESSINOTT, F. Queda de preços de fretes beneficia exportação de milho no Arco Norte. Valor Econômico, 19 ago. 2020. Disponivel em: https://valor.globo.com/agronegocios/noticia/2020/08/19/queda-de-precos-de-fretes-beneficia-exportacao-de-milho-no-arco-norte.ghtmlAcesso em: 29 nov. 2021.

[4] Instituição de um novo regime fiscal para os vinte anos seguintes a partir de sua aprovação. O projeto limita as despesas de cada um dos três poderes (Proposta de Emenda à Constituição no 55, 2016).

[5] RITTNER, D. Governo põe até R$ 2,2 bi na Ferrogrão para reduzir risco. Valor Econômico, 8 dez. 2020. Disponível em: https://valor.globo.com/brasil/noticia/2020/12/08/governo-poe-ate-r-22-bi-na-ferrograo-para-reduzir-risco.ghtml. Acesso em: 20/08/2022

[6] “A Medida Provisória altera os limites atuais: do Parque Nacional (Parna) do Jamanxim, localizado nos municípios de Itaituba e Trairão, no Pará, criado por Decreto (não numerado) de 13 de fevereiro de 2006; e da Área de Proteção Ambiental (APA) do Tapajós, localizada nos municípios de Itaituba, Jacareacanga, Novo Progresso e Trairão, no Pará, criada por Decreto (não numerado) de 13 de fevereiro de 2006 (cf. art. 1o da MP). As mudanças se devem à passagem da Estrada de Ferro 170, também chamada de Ferrogrão, em fase de construção. A MP, assim, estabelece que áreas excluídas que não forem efetivamente utilizadas, após a instalação da Ferrogrão, serão reintegradas ao Parna do Jamanxim. A Medida Provisória prevê, ainda, que os imóveis rurais privados existentes no Parna ficam declarados de utilidade pública para fins de desapropriação” (Medida Provisória no 758, 2016).

[7] A Convenção no 169 da Organização Internacional do Trabalho estabelece para todos os estados que são signatários, o “direito de consulta e participação dos povos indígenas no uso, gestão (inclusive controle de acesso) e conservação de seus territórios”. Prevê também “o direito a indenização por danos e proteção contra despejos e remoções de suas terras tradicionais” (Povos Indígenas no Brasil, 2020).